terça-feira, 31 de março de 2020



trinta anos > butterfly on a wheel | the mission

ia a passar e resolvi entrar...
assim só. nem que seja para revisitar as memórias.

passados trinta anos, falo pela primeira vez. aqui.
falo aqui pela primeira vez...
sim, de facto já se passaram trinta anos... imagina, trinta anos sem ti...
difícil de imaginar... difícil de entender...
sabes, custa sempre... ainda que o tempo amortize... e abrande... 
o tempo cura tudo, diz o ditado popular... treta... 
o tempo cura o que a nossa mente pretende esquecer...
o tempo recua e tudo demonstra e mostra.

acredito, o que sempre acredito.
que imagino que através desta tensão e desespero... soubesses que esta era na minha imaturidade... mas, quem tem maturidade para conviver diariamente com o sofrimento... a fragilidade e a perda?... confessem...
sempre me senti abençoado... por ter a família que sempre tive e em mim tenho e contenho.
mas estranhava a cruel fragilidade com que constantemente eramos incomodados... e isso sempre fez perigar o nosso quotidiano...
mas creio, também essa fragilidade e fraqueza que nos uniu. 
confesso, dada a tua constante vulnerabilidade... a ausência de constância... e já perto do fim as oscilações constantes e quase diárias... sobretudo as noites de que tanto te queixavas... 

recordarei sempre essa nossa caminhada solitária, após mais uma ida nocturna ao hospital de santa maria... quando me referiste o teu receio fundado... de que na próxima ida a inglaterra, e eram tantas... irias tentar consultar um médico... dado não estares descansado com o que te diziam os médicos aqui.
fizemos esse percurso meio em silêncio, o reflexo do luar na larga calçada... para irmos apanhar um táxi de regresso a casa...
igualmente passou a haver uma constância dessa mesma fraqueza e fragilidade...
e o que se anunciava ou previa... não era desejável...

lembro todos os hospitais e lugares por onde inevitavelmente passámos...
o hospital da cuf na infante santo...o hospital st. louis no bairro alto, onde esperei por notícias no final de mais uma intervenção cirúrgica a que tiveste de te submeter... 
e as recorrentes idas e estadias no hospital de santa maria...
todas estas oscilações no nosso quotidiano abalam... e abanam...
sobretudo quando ao nosso redor tudo está seguro e estável...

relembro as convalescenças... e as recaídas...
assumo que o mais assustador... porque desestabilizador... foi a inconstância e a inconsistência com que periodicamente nos deparávamos...
mas relembro igualmente aquele final de tarde... mais uma sexta feira... um fim de semana que se avizinha e começa...
e recordo igualmente o jornal que religiosamente te comprava... sim, esse semanário que gostavas de folhear... como todos os vespertinos que existiam na época...
sim, nunca foste pessoa de ler os matutinos... e que estranho o que estou para aqui a dizer... jornais que já nem existem...
eo disco que nesse final de tarde comprei, antes de rumar a casa... butterfly on a wheel... the mission... que creio, nem cheguei a ouvir... 
a hora de jantar que se aproxima... o carnaval prestes a iniciar...

o que sobra quando já nada sobra?
o que sobra quando já pouco ou nada resta?
o que resta quando já nada resta?
reuni os pedaços que sobram.
são estes que vivem aqui na minha memória.
que nada se perca.
  









segunda-feira, 23 de março de 2020





















conformados: texto 9 > 2 + 2 = 4


dois mais dois é igual a quatro... ou não.
é, até prova em contrário...
e porque falo eu aqui em dois mais dois.
simplesmente porque me dispus a ouvir esta tarde o the conversation dos cabaret voltaire... e igualmente o closed circuit dos electronic eye...
dois cd duplos que me preencherão a tarde toda, imagino...
à média de mais de uma hora cada cd, tenho pela frente uma aventura a rondar as quatro a quatro horas e meia... o que provavelmente me deixará pouco tempo para ouvir outro qualquer disco que eleja...
e o que me levou para aqui... perguntaram alguns...
creio que foi a electrónica suave e sensata que marcou o fim da existência dos cabs... embora agora o richard kirk tenha desenterrado o nome... se bem que richard kirk nunca tenha deixado de estar no activo... efectivamente sempre muito prolífico... nos seus alter-egos... e tantos que se lhe reconhecem...
os electronic eye... são nem mais nem menos que o richard h. kirk, numa das suas encarnações...
e aqui, embora o closed circuit seja um disco muito meritório... a verdade é que perde incomensuravelmente para the conversation... se bem que ambos os registos pertençam ao mesmo autor...
mas francamente, e essa foi a intenção inicial... sossegam... acalmam e ajudam o contexto da tarde... tornando tudo menos pesaroso...
a sua identidade... as suas intensidades e sobretudo as suas dimensões temporias, ajudam... e saram... ajudam a sarar estes tempos estranhos e solitários... em que nos refugiamos nas nossas casas... muitos e tantos... e todos.

e segredo-vos... se ainda me sobrar tempo... irei certamente ouvir o san antorium dos lowlife... onde reside entre tantas pérolas, essa que abre o disco e se chama jaw...


sexta-feira, 20 de março de 2020

 
 



confinados: texto 8 > a strange day | the cure



confesso. tenho de confessar, mesmo que soe mal...
nem tudo é mau.
dito e lido assim de chofre... soa até a cruel. não.
não é disso que se trata. tenho de admitir.
tenho lido sobretudo mais do que o pouco que já costumava...
desabituei-me de ler. sobretudo livros...
prestei mais atenção às pessoas... sobretudo através desta nova imposta distância.
fiz, faço descobertas...
encontrei instagramers aos quais não costumava prestar atenção... 
descobri directos e rotinas para noites maiores e mais longas...
assisti com milhares de internautas, a concertos... pouco interessantes... ficou a ideia e a iniciativa...
percebi o quotidiano de muitos... "entrei" em casa de tantos mais... 
apercebi-me da inteligência de alguns... e da insensatez de muitos...
construí rotinas com simples desconhecidos... estabeleci laços.
presenciei a criatividade e o engenho humano... mesmo em tempos difíceis...
ouvi mais e mais música do que o costume... se é que isso me é possível...
e falei mais com muitas pessoas do que habitualmente costumava falar... o que não deixa de ser estranho e trágico.
e aventurei-me cíclica e cirurgicamente no exterior... para manter uma sanidade mental... e testar a minha desenvoltura e coragem.
não usei máscara... não usei luvas... não creio que resida aí a solução deste enorme problema.
e pontualmente recorri a álcool... que tende por estes lados a acabar.
finalmente deliciei-me com o documentário s de stanley... acerca de stanley kubrick, que passou noite dentro na televisão...

assim sendo, se por um lado não me agrada... igualmente não me desagrada. 














pandemia: texto 7 > in my house | and also the trees

continua. continuamos aqui. todos confinados nas nossas habitações.
uns mais activos... e imaginativos... 
outros igualmente entretidos... porque enquanto solitários, estão familiarizados com estas situações... de propositadamente se isolarem... 
e a maioria em grande e aflitivo desespero... porque não conseguem lidar bem com a situação... e creio, consigo próprios.

hoje fizemos uma batida ao exterior... coisa rápida... uma ida ao supermercado para reabastecer a casa de produtos que por lapso, não tinha ainda percebido a sua fundamentalidade... sobretudo em tempos destes...
não, não me perguntem se tenho álcool... nem mesmo café.
gafe... não pensei... foi mesmo um deslize importante.
retido em casa... e com o número de cafés contado... é um pesadelo.
do álcool, já nem falo...
mas, dizia eu... que apesar da incerteza... da desconfiança... sobretudo do medo que se sente no rosto de algumas pessoas... posso afirmar que gostei.
sempre gostei das ruas e espaços e lugares... com pouca gente... 
sente-se o silêncio... e assume-se a distância... por precaução.
deixou de haver naturalidade, há um receio enorme... e uma pressa nas poucas tarefas que se cumprem. 
a desconfiança que se instalou, potenciada pelo desconhecimento e pela fobia... da nova consciencialização do perigo ou ameaça...
sente-se um receio e um temor... e nos poucos que agem com maior naturalidade, não consigo identificar se se trata de coragem... ou simples inconsciência.
e há os poucos... que já não temem... porque simplesmente não têm nada a perder...

quarta-feira, 18 de março de 2020



pandemia: texto 6 > trained condition of obedience | throbbing gristle



parado.
em estado parado. letárgico. 
vagaroso mesmo.
inerte. inertes, por decisão individual e colectiva.
o tempo continua... a passar. 
as rotinas alteram-se... o receio visível no rosto dos transeuntes quando por momentos se sái à rua...
existe... instalou-se uma desconfiança generalizada... por medo. de contágio.
nunca antes assistira a nada assim. mentira, já tinha visionada dúzias de filmes que de um modo ou outro abordam a ideia. era apenas uma visão, um conceito... sobretudo um entretenimento. nunca uma realidade.
não creio que exista um respeito... uma colaboração activa e comum.
existe um enorme receio... e uma dúvida instalada acerca da gigantesca onda que ainda não se avista no horizonte... mas que se sabe, chegará...
existe uma imensa desconfiança... primária... animalesca... um instinto de sobrevivência que já não imaginava presente no ser humano.
nos filmes, isso sim... mas isso aparentemente pertence ao mundo da ficção...
aparentemente não.




















pandemia: texto 5 > discipline | throbbing gristle

estou a citar... não fui eu que o disse, embora já por diversas vezes tenha utilizado esta citação...
tempos desesperados exigem medidas desesperadas...
a quem ouvi este pensamento... e creio já estar a ser reproduzido em segunda-mão, foi ao mark e. smith... líder dos the fall.
sim, é certo que vivemos tempos extremos, que poderão requerer medidas igualmente extremas...mark e.smith sempre foi um tipo de extremos. 
mas já cá não está para conviver com a realidade actual... nem tão-pouco genesis p-orridge, desaparecido na passada semana... igualmente um inconformado... extremista e porventura igualmente uma mente marginal que chegou a referir logo no início da formação dos throbbing gristle... 
"os punk-rockers diziam para aprender três notas e formar uma banda... nós pensámos, para quê aprender qualquer nota? queríamos fazer música como a ford fazia carros. música industrial para pessoas industriais."
mentes assim fazem falta... porventura farão falta em tempos assim...

segunda-feira, 16 de março de 2020
















pandemia: texto 4 > night raid | nick cave & the bad seeds



preso. e indeciso.
estou aqui bloqueado... e nada me custa.
sempre gostei da minha companhia, por vezes até apenas programada.
porque de quando em quando, desejada...
confesso aqui um segredo... 
chego a programar... esse meu isolamento... 
e gosto, confesso que gosto. assim como que um retiro...
para o qual me envio e protejo...
e ali solitário, fico... apenas na companhia de alguns dos meus livros... textos... mas sobretudo música.
a música é essencial para qualquer reconhimento, digo eu.
tão fundamental como o silêncio... talvez porque conscientemente alguma da música que eu oiço... privilegie tanto o silêncio...

mas agora sinto-me inquieto... porque igualmente indeciso.
aqui socialmente isolado... nesta quarentena a que nos impusemos... e igualmente nos foi imposta... e que estamos determinados em cumprir... hesito e evito...
as duas grandes descobertas mais recentes, oiço-as à distância...
o ghosteen que acidentalmente me foi permitido escutar... com aquela atenção que ele provavelmente sempre mereceu... e ao qual eu não prestei a devida atenção ou estive atento...
agora receio... terei de esperar por outros dias... que não estes... para fisicamente lhes poder aceder...
falo obviamente do ghosteen do nick cave & the bad seeds... aos quais eu já não prestava atenção à alguns anos... do born into the waves dos and also the trees... tão ignorados que chega a doer... e da revisitação à discografia mais antiga dos no-man... pela mão de speak... flowermouth... together we're stranger... 
imperdoável... ia esquecendo... a trilogia dos piano magic que agora tanto me acompanha... e faz companhia... part monster... the troubled sleep of piano magic... e obviamente a síntese seasonally affective... 
e assim sendo, neste isolamento a que me dediquei... o mais óbvio seria optar por ouvir... transmission... isolation... disorder... spread the virus... a touch of evil... sobretudo pela actualidade... mas não.
opto pela descoberta e redescoberta...

pandemia: texto 3 > speak | no-man



continuamos. por aqui continuamos. aqui restamos.
confinados ao interior das nossas casas. nós e creio tantos outros por esse mundo fora, é estranho... no mínimo é estranho. muito estranho.

não o sentimento de isolamento, o qual me é familiar... e com o qual sempre convivi bem...
é sobretudo a sensação de insegurança. e incerteza.
a que inconscientemente já não estávamos atentos e habituados.
mas sobretudo, creio, pela primeira vez para estas gerações... um nevoeiro que veio, chega, assenta e que se adensa... 
esse o grande receio, do desconhecido... do que está para chegar.
a sociedade medieval contemporânea não estava preparada para isto. 
não se imaginava. era apenas na ficção.
nada disto se imaginava, sobretudo porque nada disto se desejava...



domingo, 15 de março de 2020





















estranhos tempos II > isolation | joy division

viajo...
viajo... não viajo.

estranhos tempos estes.
tempos estranhos estes que agora se vivem.
como tantos e acredito, todos os outros... aguardo... confinado e recolhido. em casa.
confinado e conformado.
nunca imaginámos coisa semelhante... 
nunca desejámos coisa semelhante.
embora a mente humana... perversa e criativa... sempre viajou em ambientes similares...

fosse na perspectiva mais banal de um mundo de distorsões e permutas...
tipo walking dead que tantos descendentes ajudou a criar... e contaminar...
fosse ainda na pele avassaladora de uma invasão extraterrestre... 
fosse na génese de um cataclismo ou mesmo nova teoria evolutiva...
o certo é que sempre viajámos na ficção científica e até mesmo no nonsense primário da questão... nunca estivemos tão próximo desta realidade um pouco assustadora... sobretudo porque desestabilizadora.
alterou o nosso quotidiano... ocidental.
restringiu a nossa liberdade.
sobretudo cancelou as nossas vivências e deslocações... tão fundamentais na sociedade contemporânea...
ouve-se agora provavelmente com mais afinco o isolation e o disorder dos joy division... mas mesmo actual e acertivo, é fatal e infelizmente o spread the virus dos eternos cabaret voltaire... sobretudo um dia após o desaparecimento de genesis p-orridge mentor dos throbbing gristle... 
o que torna tudo ainda mais obscuro...

estranhos tempos estes, que se entranham...















estranhos tempos > hollywood | nick cave & the bad seeds



estranhos tempos estes.
tempos estranhos estes que agora vivemos.
aguardo... confinado e recolhido. em casa.
creio, como a generalidade do planeta... se consciente.
nunca vivemos nada assim... dizem.
já devemos ter vivido algo semelhante... se não mesmo pior.
não está cá ninguém para o confirmar...

a velocidade de propagação... 
a velocidade de informação... são sobretudo avassaladoras...
e assustam... tudo e todos, confinando os mais conscientes a um recolhimento voluntário... ainda que severo e obrigatório...
e esse mesmo isolamento atira-nos e devolve-nos... o que há muito havíamos prescindido.
livros... filmes... música em catadupa...
e obviamente as descobertas... ou mesmo em alguns casos, redescobertas...
oiço agora em catadupa o novo registo do nick cave, ghosteen de seu nome... e o último álbum dos and also the trees, já assim não tão novo (2016)... que me relançou numa maratona da maioria da sua discografia...

o caso do novo registo do nick cave & the bad seeds... é um caso sério.
o nick cave prova assim a sua inteligência... da qual eu nunca duvidei... mas que se vê aqui reafirmada...
o disco é maduro... consistente... íntegro e soberbamente bom.
é um disco de alguém que prova que simplesmente amadureceu... e envelheceu.
o seu registo totalmente despojado e sincero... é igualmente e inteligentemente defensivo.
nick cave joga à defesa... é fá-lo bem...
ghosteen é um magnífico exemplo de alguém que tem consciência das limitações da idade... mas que igualmente transmite ponderação... experiência... e reserva.
deixou aqui de haver lugar a raiva exagerada... a um rock que sempre espreitou e rugiu... tendo tido o seu expoente máximo na sua trilogia inicial... sendo que the firstborn is dead é o mais devoto ao rock de todos...
se bem que pérolas como avalanche... sad waters e stranger than kindness... não sejam nunca de desprezar.

no caso dos and also the trees... o seu último e muito ignorado álbum... born into the waves... é demasiado bom e sereno... para poder ser... popular.
já os seus magníficos antecessores... further from the truth e o (listen for) the rag and bone man... passaram despercebidos e assintomáticos ao ouvido do comum cidadão, não era agora este registo que iria alterar os factos.
mas, não.
em born into the waves residem pérolas como hawksmoor & the savage... seasons & the storms... para citar apenas algumas... impossíveis de ignorar, porque incontornáveis.
hawksmoor & the savage é puro and also the trees... intrigantemente no seu melhor... quando já ninguém ou nada davam por eles...
de um brilhantismo avassalador.

estranhos tempos estes...




terça-feira, 10 de março de 2020




trilogia encantatória > simple minds




ano mil novecentos e oitenta e um. simplificando, 1981.
ano dessa trilogia encantadora que os simple minds prolificamente produziram nesse longínquo ano de 1981. 
em plena época de nascimento de música de qualidade muito acima da média, os simple minds produzem esses álbuns gémeos... denominados sons and fascination e sister feelings call... que se podiam adquirir juntos ou em separado... e esses três magníficos registos... em formato 7 e 12 polegadas...
primeiro surgiu na primavera o the american... mais irrequieto e duro... seguindo-se no verão o love song mais pop e provavelmente romântico até... mais adequado à época estival... terminando por concretizar a trilogia com sweat in bullet... surgido já no final do outono desse mesmo ano... e talvez por isso mesmo, mais discreto... calmo e cinzento...

esse foi não apenas o período mais fértil dos simple minds, mas igualmente o mais consistente e coeso... com as músicas a construirem um todo coerente e conciso... dando aos registos uma carga e força como poucas bandas almejaram conseguir...
sendo de destacar sobretudo o de se estar a falar de singles... 

e na realidade não poderia haver nome mais significativo para toda a obra dessa época... dados que se produziram irmãos e irmãs... mas sobretudo um fascínio que perdurará e dificilmente se repete...




sexta-feira, 6 de março de 2020




serenidade > runway doubts | departure lounge


hesitei.
confesso que hesitei.
entre ouvir o runway doubts... e o too late to die young.
decidi-me à última da hora pela primeira canção. 
sim, porque é de uma canção que se trata...

confesso... 
é me sempre difícil falar dos departure lounge... e da sua música.
este jetlag dreams é um portento... um caso sério musical...
onde as melodias crescem e encantam em catadupa... e de tão grandiosas e despojadas, chegam a assustar
sendo difícil a decisão... daí a hesitação.
e depois há o out of here... e o out of there... e tudo se torna mais complicado.
ambos majestosos... e que a seu tempo se fundem e confundem, nessa grandiosidade serena... que tudo abate e abafa.
porque acalma. tudo acalma e amaina. 
e distrai. do mundo lá fora. abranda, de tudo o que nos rodeia.
quando se ouvem as melodias dos departure lounge, nada mais importa. apenas isso importa.
como também importa sobretudo essa inquietante melodia de que, creio, já aqui falei... o straight line to the kerb... diferente, sim... mas não indiferente.
existe aqui na música construída pelos departure lounge... um magnetismo melódico que tudo abafa... e nada, mesmo nada mais importa.

é um privilégio de poucos.
diria mesmo, de muito poucos.
há o caso óbvio do vini reilly, do david sylvian... eventualmente a espaços, dos felt.
do glen johnson... do robin guthrie, john foxx e harold budd.

sim, é um privilégio de poucos, a criação dessa serenidade e encantamento.
geradores de uma tranquilidade que chega a assustar, de tão intensa e triste...
mas de uma tristeza delicada e apaziguadora... que tudo acalma e serena.

senão oiça-se o runway doubts... ou o too late to die young... e decidam...















na juventude > on your own | githead



nem sempre é, foi assim.
sim, nem sempre foi assim...
porquê, não sei...
porque não sei. para quê, muito menos...

sei apenas que nessas idades sabemos tudo de uma forma desenfreada, selvagem mesmo.
somos assim, não necessitamos da nossa personalidade e da nossa cultura.
na juventude o corpo basta-nos. 
chega. 
é o que geralmente usamos. como trunfo.
pouco, porventura o cérebro... nunca a cultura.

ainda não desenvolvemos uma estrutura coreácea... uma ossatura que nos permita a pacificação e uma postura, por vezes apenas... serena e inteligente.
a juventude é isso mesmo... uma identificação primária... um desejo de integração e sobretudo aceitação... em última análise um reconhecimento...
as palavras existem sem nomes... e mesmo os nomes por vezes não passam de códigos e alcunhas... com que nos identificamos e integramos...
integração e interacção é tudo o que pretendemos.
em última instância interagimos por impulso... por resistência.
ainda não sofremos na própria pele tudo aquilo que mais tarde reconhecemos, que diremos por simples palavras.
aqui, nesta idade, os actos bastam-nos...

quinta-feira, 5 de março de 2020






















laxantes > machine gun | slowdive

como se fosse hoje. 
lembro o seu lugar. religioso.
religiosamente guardado no aparador do lado esquerdo da sala de jantar... 
sempre na primeira prateleira... acessível e diariamente disponível... 
a sua embalagem amarela,,, com letras castanhas escuras... 
e que era utilizado com uma regularidade... religiosa. agiolax de seu nome... um laxante natural que se verdadeiramente nunca utilizei... 
reconheço tudo aqui. 
as cores, a dimensão da lata... a sua forma cilíndrica com tampa de plástico de enroscar branca... 
e as letras castanhas... reconheço até o que continha... um granulado igualmente castanho, semelhante à cor de chocolate puro... 
e obviamente os dois aparadores que dominavam a entrada da sala de jantar, posicionados de ambos os lados da porta de entrada... 
sei distintamente as suas disposições... cores... materiais e texturas... 
reconheço inclusivé os puxadores e fechaduras... que de tanta utilização, memorizei. 
o aparador do lado esquerdo da sala, composto por duas portas e uma parte central com três gavetas... sendo as respectivas zonas de portas constituídas por duas prateleiras... sendo na prateleira superior do lado esquerdo, onde a minha mãe colocava este tipo de medicamento... e alguns utensílios... e os guardanapos religiosamente guardados numas capas que ela própria havia tricotado. 
a minha verde água... a do meu irmão castanha clara... e as dos meus pais, ambas brancas... 
reconheço igualmente o aparador da direita... 
composto por quatro portas... duas centrais e duas laterais... 
nas laterais junto da mesa da sala... alinhados os pratos brancos do dia a dia... 
no seu interior mais amplo da zona central... os pratos e loiça mais delicada e menos usual... 
onde havia lugar igualmente a duas gavetas superiores que tanta história poderiam contar... nem que fosse apenas através daqueles talheres dispersos e únicos da nossa infância... sim, porque na minha infância as crianças comiam com talheres de cabo de plástico, encimados por um vulgar acabamento em metal...

e agora feito este exercício de ginástica mental... vou dedicar o meu precioso tempo a ouvir machine gun... slowdive.

quarta-feira, 4 de março de 2020





















afrouxem a braçadeira > what's your desire | wire



assim mesmo. 
desde o início. e se pensar melhor, creio, desde sempre...
confesso. 
nunca entendi.
nunca entendi o porquê...
esta desatenção... essa indiferença... a ignorância a que são votados...
quer os magazine... o bill nelson... mesmo os mais actuais piano magic.
não entendo...

os magazine são um caso de estudo, sinceramente.
deviam ser dissecados... tal é a sua ostracização...
estão excluídos... marginalizados da história da música popular dos anos que lhes eram devidos... final dos anos 70... 80... e 2000 e tal...
não existem, ainda que figurem...
como é possível ficar-se indiferente a melodias como feed the enemy... back to nature ou mesmo permafrost...

o bill nelson é igualmente um caso estranho...
com tanta actividade musical, sinceramente edita discos em catadupa... e, vai-se a ver... e nada.
rigorosamente nada.
quem pariu um disco da dimensão do the love that whirls (diary of a thinking heart)... tem obrigatoriamente de figurar na história... mas, não.

no caso dos piano magic... a indiferença adensa-se... 
aqui é mesmo um caso de pura ignorância... 
com tantos discos produzidos... e tantas músicas e canções de excelência... chega a ser violenta... a indiferença.
ignorância digo eu... 
onde se farão ouvir melodias como crown estate... england's always better (as you pulling away)... you never loved this city... the blue hour... the last engineer...

haverá alguém que me saiba apresentar uma justificação?...
ou haverá alguém que me dará razão...