sexta-feira, 26 de janeiro de 2018




morreu o imortal > baby turns blue | virgin prunes


morreu.
assim só, sem aviso prévio...
extinguiu-se... desvaneceu. desapareceu.
sumiu-se deste mundo...
ficámos sem mark e. smith... perdemo-lo... e todos ficámos e ficamos a perder...
mesmo os que nem sequer sabiam da sua existência.
morreu o trouble maker maior...
o mais inconformado... o mais problemático.
que não o maior problema...
era assim mesmo, estava-lhe na génese... na genética digo eu...
era difícil não ser problemático em manchester... era difícil não ser operário em manchester... nessa cidade suja... fabril e industrial... berço dos the fall... dos joy division... dos magazine... de morrissey... ian curtis... howard devoto e mark e. smith... que continha todo o mau carácter mas igualmente a perspicácia de nenhum dos outros...
não se lhe conhecia hábitos de ser simpático... aliás a sua maior virtude era mesmo a sua maledicência... algo que tanta falta faz neste nosso mundo contemporâneo tão polido e correcto...
deve haver inteligência... perspicácia... sentido de humor... para haver lugar ao sarcasmo... e não devia ser possível... devia ser mesmo impossível... proibido mesmo não existir em todas as periferias urbanas citações escritas e graffitadas com a raiva e a bílis desse seu pensamento.
pensamentos como "tempos desesperados exigem medidas desesperadas"... deviam ser obrigatórias, digo bem, obrigatórias em todas as paredes de todas as periferias das grandes cidades do mundo...
quando se constrói um percurso numa vida sem nunca se mudar absolutamente nada... no mínimo obtêm-se um elogio como esse que john peel lhes fez... "sempre diferentes, sempre os mesmos"... 
extingui-se... desvaneceu-se... desapareceu.
morreu-nos. e mesmo sem saber, todos ficamos a perder...




quarta-feira, 24 de janeiro de 2018





a primeira urina da manhã > alas dies laughing | cocteau twins




lembro... lembro-me como se fosse hoje...

lembro... lembro-me como se fosse hoje. hoje mesmo.
recordo com uma precisão assustadora até o momento... o preciso local onde me encontrava.
havia acabado de receber das mãos do meu pai... no regresso de mais uma viagem a inglaterra... essa pérola chamada garlands... primeiro registo dos cocteau twins... que apressada e avidamente ouvi... num loop contínuo e frenético...
e corri a casa do meu melhor amigo... com esse registo aconchegado ao peito... qual tesouro ainda por descobrir...
e ao chegar aquela casa situada no 3º andar... foi com enorme entusiasmo e sobretudo orgulho... que lhe o mostrei...
imediatamente nos decidimos a ouvi-lo... quando no rádio surge uma música familiar mas que não constava naquele mesmo disco que eu ainda abraçava...

mistério... profundo mistério... imensa decepção...
sobretudo porque o registo me era tão familiar...
havia devorado o garlands sucessiva e progressivamente... e esta melodia que agora mesma escutava... era tão semelhante...

estranho... tudo tão estranho... porque não fazia sentido, algum. nenhum.
mal eu sabia ainda que... o garlands vinha sucedido de lullabies... esse magnífico 12 polegadas... tão próximo... que praticamente lhe era igual...
o garlands era do dia 1 de setembro... lullabies de 1 de novembro... desse distante ano de 1982... o que à data era invulgar...
e de tão inusitado... confundiu-me... e decepcionou-me...
porque eu queria estar na posse de todos essas melodias... que agora mesmo me escapavam...
não. não é sobretudo vulgar um single sair após um álbum...
os singles habitualmente precediam os álbuns... anunciando-os.
sobretudo menos vulgar ainda não possuírem música alguma em comum... nenhuma.
mas isso passou a ser imagem de marca da 4AD... e eu habituei-me...
recordo como se fosse hoje mesmo, esse final de tarde...



terça-feira, 23 de janeiro de 2018













antes era assim > double dare | bauhaus


antes era assim... foi assim.
comigo sempre foi assim... 
se agora sodus e os cemeteries tudo preenchem... e serenam... tal como já o havia sido com os no-man... os dead can dance... eyeless in gaza... mas sobretudo o victorialand dos cocteau twins... onde essa tranquilidade se espraiava e densa... acalmava...
antes... bem antes foi, era sobretudo o inverso.
era essa raiva contida... esse sufoco preso... um desconforto e descontrolo desmedido... porque quando fomos jovens... somos sobretudo destemidos...
e assim foi... fosse ver-me assim revisto... nos bauhaus... nos virgin prunes... nos siouxsie & the banshees... echo and the bunnymen... the mighty wah!... ou tão somente... nos dormentes joy division e section 25... ou nesses maléficos swans...
sim, é um facto... somos da mesma geração... quase todos da mesma idade...
e à nossa maneira fomos todos intrépidos e destemidos...onde a ausência de consciência chegava a provocar o sumiço e o absentismo do medo...
oiça-se o in the flat field... o if I die... I die... o heaven up here... e constacte-se.
esse inconformismo... essa quase revolta latente... própria de uma juventude... desencantada.
tu não me conheces... vocês não me conhecem... eu estrago coisas...
sim, tenho um jeito natural para estragar coisas... sentimentos... emoções... relações...
simplesmente destruo... torno oco... esvazio.
talvez pela indiferente indiferença...
sim, eu estrago coisas... eu magoo. eu chego a magoar. porque estrago.
e assim sendo, estas melodias aconchegam... e acariciam essa fase... menos boa...
e aqui, imagino toda uma juventude revolta... que se reviu...
que não, nunca... os que aqui apenas passaram por oportunismo... por moda... ou simplesmente estúpido "estilo"...
antes foi assim... 
comigo sempre foi assim...

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018





















não consigo > empty camps | cemeteries



não consigo.
confesso.
não consigo parar de falar... porque não consigo parar de ouvir.
esta adição que se tornou obsessão...
os cemeteries... mas sobretudo este segundo registo... barrow... acredito, faz parte... já faz parte de mim... 
existem aqui melodias... impossíveis de evitar...
tudo aqui é inevitável... porque inesquecível.
estes sons... sobretudo esta sensação de calma... de tranquilidade.
confesso que acho que jamais havia experenciado algo semelhante...
é como sofrer... é como sentir, suportar... sufocar mesmo.
é inevitável... porque incontornável...
oiça-se sodus ou empty camps e... é tudo tão arrebatador... que tudo se torna impossível...
é inevitável... como quando existe um grande amor.
sim, um grande amor. existe aqui um estado e uma dimensão incontornável.
não é possível... evitar. porque é inevitável...
não é possível ignorar.
não é possível contornar... torna-se incontornável e viciante...
mas, é um vício bom. calmo. sereno e tranquilo...
e confesso... não consigo mesmo evitar... de desejar estes sons... assim.
não desejo... e não consigo.
confesso.
à semelhança do intro dos the xx...
mas isso é outra estória... desta mesma história. a minha.

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018




a certeza > the honeymoon is over | whipping boy

destes tenho a certeza.
nunca aqui deles falei. nunca aqui falei dos whipping boy.
imagino que nem sequer dos puressence.
e hesito... 
apenas hesito entre qual deles falar...
se dos puressence e porventura do sharpen up knives... ou mr. brown...
ou se me fico pelos whipping boy e até talvez the honeymoon is over...
moeda ao ar... 
saiu whipping boy...
vamos lá então...
os whipping boy são?... eram?... oriundos de dublin... irlandeses portanto...
e nunca foram muito prolíferos, diga-se...
tiveram um disco inicial... submarine de seu nome... obscuro e marginal... até surgir o heartworm.
mais acessível... mais duro até talvez... que não rock...
e foi este registo que estranhamente se difundiu... e proliferou por aí...
sem nexo algum dirão alguns...
havia nele melodias... que eram intensas e interessantes... mas não em demasia.
acho que por vezes foi sobretudo a voz que nos arrastou e aprisionou...
senão oiça-se the honeymoon is over...
disso tenho a certeza.


sexta-feira, 12 de janeiro de 2018















a vida por um fio > life slips by | cabaret voltaire

nunca me referi... ou raras vezes o fiz. aqui.
sobretudo aqui. porque verbalmente sempre fui um entusiasta... inflamado mesmo... propaganda gratuita... 
sempre que em conversa surgia o tema da música... invariavelmente eu referia os cabaret voltaire...
devia tê-lo feito mais... muito mais, mesmo.
os cabaret voltaire merecem-no, sempre o mereceram...
mas não. poucas referências lhes fiz. infelizmente. pelo menos assim, por escrito.

a sua vida musical tem fases e facetas distintas...
a primeira... primitiva e experimental... demasiado experimental dirão até alguns...
mais próximo desse som industrial que povoou o final dos anos 70 e início dos anos 80...
em grande rivalidade e cumplicidade até com os throbbing gristle... o famoso processo de cut-out tão em voga na beat generation...
até se tornarem mais mansos... e populares...
pelo menos assim o pretenderam... e tentaram...
foi nessa fase electrónica a roçar as grandes plateias e os grandes estádios... por onde passaram os simple minds... os U2... que se ouviu esse hino chamado just fascination... que rivalizava... com tudo e com... nada. simple minds? ou simplesmente nada...

seguiu-se uma fase dançável... com uma enorme pendente urbana... onde o hip-hop se enraizou... o acid house... e as discotecas... manchester virou madchester... ibiza... a cultura rave... sobretudo a haçienda... onde os cabaret voltaire navegaram e se esfumaram... porque perderam a crucial identidade...
a dança mais apelativa do que a razão... a noite mais interessante do que o dia...
as batidas e as pulsações... as noites mais intensas do que os dias...

assim vaguearam por registos menores e desinteressantes... até novamente surgirem mais distantes... frios e assim mesmo, só... encantadores...
o plasticity... o international language... até mesmo o the conversation estavam povoados de antigos fantasmas, soturnos e bons... condizentes com um passado onde existem pérolas tais como 2X45... the voice of america... ou tão só... red mecca...

oiço agora just fascination... como poderia ouvir spies in the wires ou mesmo blue heat... ou até life slips by... nesse diálogo com as massas...que não passou disso mesmo...
uma simples tentativa... embora enorme.



terça-feira, 9 de janeiro de 2018




nunca foi engano > always now | section 25



por vezes é assim, foi assim.
quando se brinca com as palavras... por vezes tudo corre assim.
imagino que seja de propósito. só pode ter sido.
também aquando do segundo registo dos section 25 isso aconteceu...
se o primeiro álbum o superior always now... 
soberbo e sublime mesmo... que os próprios decidiram fazer confundir...
porque simplesmente tudo baralharam.
o the key of dreams abre com um tema chamado always now...
isso mesmo.
só que a diferença... é abismal...
quem esperava o mesmo... desengane-se...
e esse deve ser mesmo o gozo... o trocadilho...

devem-se ter fartado de gozar... connosco.
já de si... ter o nome do primeiro registo... no tema de abertura do segundo...
é, só pode ser propositado... de tão inusitado.
e aí reside o gozo... porque igualmente a confusão...
e de tão díspares que os discos são... adensam-se as dúvidas...
é que existisse um fio condutor... uma continuidade... era plausível...
agora assim... de tão discrepantes que são... tudo surge no mínimo, bizarro.
e esse deve ter sido mesmo o propósito... essa a intenção...
nunca houve lugar ao engano... 
porque nunca foi engano. 
apenas logro ou engodo...


segunda-feira, 8 de janeiro de 2018





















o cão a seu dono > even dogs in the wild | the associates


billy mackenzie... ou alan rankine...
inicialmente os the associates eram dois... sim, 2 proto-músicos...
mas rapidamente se tornaram 4 ou 5... se contarmos com a martha ladly...
quando perigosamente se aproximaram do limite... da pop...
e obviamente transpuseram essa delicada linha imprópria de se ultrapassar...
dado que o retorno é... mais do que impossível, digo eu...
a partir daí o percurso é mais denunciado... popular mesmo...
menos íntegro diria eu, e honesto...
existe o fantasma de uma popularidade que tudo assombra... e define. decidindo.
dificilmente se volta atrás...
e se existiram pérolas como the affectionate punch (em duas versões mesmo)... foi sobretudo no fourth drawer down... que tudo se definiu...
melodias nervosas e rastejantes... com óbvias piscadelas a uma pop que surgia entre as cinzas do movimento punk... mas ainda distantes desse top of the pops que tudo envenenou e consumiu...
o registo que se seguiu... sulk... é um monumento estético... que descaradamente se declara já ao universo pop... num imaginário fácil e lânguido... que apenas serviu de ponte ao que se lhe seguiu...
até aqui tudo era radiante e demasiado bom... para poder ser esquecido... 
mas com o loveboat tudo efectivamente se desmoronou...
desde a estética... ao grafismo... ao som.
entrava-se numa era de trevas, semelhante a tantos outros... e estou só a lembrar-me de alguns... fossem os cabaret voltaire... os new order... ou simplesmente os simple minds...
já ninguém resistia ao apelo do pop... e da dança... e da tv... e do video...
criando-se melodias fáceis e descartáveis... com discos longos e demasiado batidos... a fazer lembrar que o fantasma do john travolta era afinal, bem real...

se o billy mackenzie em fim de linha se retratou... e criou belas melodias debaixo de uma depressão demasiado evidente... 
quanto ao alan rankine apenas um registo que foi demasiado mastigado...e produzido... com músicas que se sucediam em diversos registos... nunca se compreendendo se efectivamente se tratava de originais... ou meras compilações...
não que aí não residissem pérolas... mas o sopro de novidade já havia partido em outras e novas direcções... deixando os associates assim como que perdidos...

o seu, a seu dono... 
fico-me pelo q quarters... o white car in germany... o even dogs in the wild... 
quando a solidão e um certo exílio imperava... numa electrónica feliz e eficiente... por vezes até soturna e taciturna... ainda pouco dada à convivência social...

















natal 1995 > la belle et la bête | philip glass



hoje um tio meu morreu.
ou até talvez tenha sido ontem... não sei ao certo.
recebi uma chamada a dizer isso mesmo. que ele tinha falecido.
é estranho... pensando melhor nisso, é deveras estranho.
quase todos os meus familiares faleceram durante o inverno.
faz agora um ano que outro tio meu morreu.
e aqui reside sobretudo a ética... perante a vida... perante a morte.
há uma honra... uma dignidade, uma integridade... que apenas alguns conseguem preservar em todas e quaisquer circunstâncias... elevando-as...

são essas tomadas de decisão que por vezes tudo definem...
o modo como se viveu a vida... os princípios que a regeram...
há uma integridade... uma distinção... uma nobreza mesmo que distingue e define a vida de pessoas assim.
esse era... foi o caso...
sempre com um comportamento exemplar... e uma disponibilidade única... mesmo quando da nossa... minha parte havia até um certo distanciamento... que poderia provocar algum ressentimento... nenhum.

ainda guardo o agrado com que o presenteei nesse longínquo natal de 1995...
ofereci-lhe essa ópera de philip glass... baseada na obra de jean cocteau... la belle et la bête...
sei-o agora...
essa sua singularidade e aparente distanciamento... não lhe permitiu... porque não lhe permitia. simplesmente. 
havia, devia haver sempre um certo distanciamento... uma aparente indiferença.
aqui não era o caso... bastava a sua presença... o seu silêncio.
sobretudo a sua presença... e o seu cuidado e empenho, eram uma constante...
assim como a sua disponibilidade para ajudar... tentar resolver...
eu sei. tenho, guardo mesmo provas factuais disso...
habituei-me... habituou-nos a que familiarmente sempre se comportou assim. perante nós. e não só.
confirmo-o agora.
confirmei-o agora... com esta última decisão sua.

hoje mais um tio meu morreu.
que não um tio qualquer.








terça-feira, 2 de janeiro de 2018

















ano novo, vida mais velha > I dare you | the xx


ano novo, novo ano...
num novo ano... o que para mim invariavelmente significa... estar mais velho...
por cada celebração de ano novo... fico igualmente mais velho... associo mais um ano ao registo anterior...
é o que dá ter nascido nesse fatídico dia 1 de janeiro...
mas adiante... que após estes anos todos... até já me habituei.
verdade seja dita... não tive outra alternativa...
quando não há alternativa... temos que nos acostumar...
não é hábito, é mesmo resignação...
o tempo passa e as pessoas resignam-se... 
não que se acostumem... simplesmente deixam de agir, de reagir...
resignam-se, portanto...
e comigo é sempre assim um pouco... 
ano novo... vida mais velha um ano portanto...