quarta-feira, 26 de outubro de 2016













como memórias > october man | bill nelson


o quarto era pequeno... escuro...
imagino que a casa também o fosse. pela dimensão do inexistente hall...
o comprimento e a largura do corredor.
aquele pequeno prédio ao início da rua... no bairro dos actores... onde costumávamos ficar horas a ouvir... mexer e remexer nos discos entretanto importados...
e na ânsia da escolha das próximas... e as dúvidas...
número 55 creio... o número da porta... e aquelas escadas... de acesso ao rés-do-chão...
e o caminho curto e familiar que invariavelmente conduzia aquele quarto onde se passavam horas de plena escuta... e descoberta...
assim surgiram os crispy ambulance... os dead or alive... o bill nelson... os the wake... os wah!... entre tantos outros... que até hoje perduram...
ainda recordo o nervosismo nas minhas mãos ao pegar pela primeira vez no harmony... e no the plateau phase... 
até mesmo a primeira vez em que levei para casa the love that whirls... emprestado...

o quanto todos gostávamos dessas descobertas... e de nos pormos a imaginar... assim só na distância... no desconhecimento... até mesmo na ignorância...
até mesmo as revistas e fanzines da época eram por nós devorados e consumidos... na ânsia de tudo tentar perceber...
imagino que não saibam... alguns não podem mesmo saber... sequer entender...
o silêncio... o desconhecimento... pela distância...
por vezes surgiam rumores assim só... de que estava para sair o disco tal... que já tinha saído o single... 
e tudo o que nos pudesse simplesmente transmitir informação... no fundo a maior das simplicidades actualmente... o estar informado.
assim igualmente comprávamos as revistas... que existiam...
as mais colaterais... as mais divergentes... afinal estávamos todos em busca de música independente...
ainda guardo alguns desses pobres fanzines... e as revistas da época...
por vezes ainda regresso a algumas entrevistas contidas nelas...
e retenho na memória os pequenos sete polegadas que o zé paulo tanto gostava de adquirir... 
era um gosto muito próprio... mas que quer a mim e ao luís carlos tão bem soube...
pois foi apenas aqui que ficámos a conhecer tantos e todos aqueles lados B... improváveis ou impossíveis de encontrar em mais algum lado...
sim, porque os lados A dos sete e doze polegadas divergiam pelas versões... mas sobretudo pela sua respectiva dimensão... igualmente os lados B ou 2 por vezes também não coincidiam...
e eu que sempre fui um adepto fervoroso dos maxi-singles... 
mas isso já há muito que foi dito... tantos e todos o sabem...


terça-feira, 25 de outubro de 2016

2016: tudo a extinguir-se > in time | the names

tem sido um ano estranho... musicalmente falando.
logo no início o desaparecimento do bowie...
depois seguiu-se o alan vega... e pouco depois o steven young... igualmente durante o verão... 
a notícia da morte da caroline crawley... surgiu já no outono... e agora desaparece o pete burns...
claro, ouve mais... infelizmente muito mais... recordo o prince...
mas estes... neste fatídico ano de 2016... fazem... fizeram parte da minha juventude e muita companhia faziam...
com o david bowie cresci... cresci com ele... e com essa magnífica trilogia que jamais viria a igualar... obrigado brian eno... obrigado berlim...
low... heroes e lodger...
o low trouxe-me muito... trouxe-me tudo...
o low sobretudo trouxe-me o warszawa... os warsaw... os joy division... trouxe-me tudo...

o alan vega e os suicide... o que dizer...
cheguei a vê-los ao vivo... mas tenho especial carinho pelo segundo álbum... o segundo registo... homónimo...o que dizer de diamonds, fur coat, champagne... mr. ray... fast money music... touch me... ou be bop kid... confinado às paredes brancas do meu quarto térreo... quanta companhia estas melodias me fizeram...

o steven young... reconheço que foi mais esporádico... apenas em alguns trechos dos colourbox... e dessa editora memorável que dava pelo nome de 4AD...
sleepwalker... the moon is blue... you keep me hanging on... arena... e até as duas versões de tarantula... preencheram tardes... noites dentro... apenas quando a popularidade transbordou e tudo invadiu... eu me afastei... 
pump up the volume... nos rádios incessantes... recordam-se?...

com a caroline crawley apanhei um choque...
acreditava que os anjos morriam nunca... 
nunca morreriam... 
é falso. sei-o agora...
com o desaparecimento da caroline crawley... definha e desaba mais um pedaço da 4AD...
se na sua banda original... de seu nome shelleyan orphan... a sua voz estranha e melódica tudo preenchia... foi sobretudo nos this mortal coil que se tornou eterna...
oiça-se  late night... mr. somewhere... ou simplesmente, the lacemaker... e help me lift you up...
assim apenas... acreditei que os anjos nunca morrem...

agora o pete burns... nos antípodas... 
não podia estar mais distante... 
mais afastado da doçura de caroline crawley... carrega apenas o ano da sua morte...
os dead or alive foram um misto... de paixão e ódio...
a fase inicial... mais bauhaus... cult e danse society... foi a melhor... foi soberba...
a fornada de singles que teve início em I'm falling... prosseguiu em number eleven... the stranger... e teve o seu apogeu em it's been hours now... esse obscuro maxi-single que ombreava com qualquer outro na sua época... e que continha essa pérola denominada de nowhere to nowhere... 
seguiu-se misty circles... e com what I want... não apenas se instalou a confusão... reinou a pop e a decadência... e eu, assim só perdi-lhes o rasto...
do auge ao cadafalso foi apenas um pequeno passo... que não um lapso...
fica assim a música mais só... e esses míticos anos 80 desse século XX... mais pobres e mais vazios.


quarta-feira, 12 de outubro de 2016
















na distância > the nostalgist | piano magic


a estrada não a reconheço...
porque já tanto tempo passou... e não a conheço...
a estrada parece infindável... interminável na invisibilidade...
o nevoeiro denso e extenso... que não permite ver, perceber a distância...
e o hugo que se queixa e põe o capuz... e os pés frios nas primeiras horas da manhã...
como se a saudade não fosse já imensa... e o carro avança... no sol que custa em surgir...
e nas placas que anunciam a distância... que parece não diminuir...
e o tempo que passa e urge... e tarda em chegar... a esse destino...

revelo-o agora... simpatizei com a terra... com o complexo da escola... sobretudo a materialidade e a tranquilidade da paisagem envolvente...
a escala... o espaço envolvente... o território...
as casas que visitei... desagradáveis e claustrofóbicas...
sujas e caóticas... anárquicas. e velhas.
não a imaginava assim, a povoação... tão... desnivelada.
de onde surgiu um território tão acidentado... numa tão vasta e imensa planície...
como é num terreno tão plano surge uma povoação tão íngreme... e solitária...
a vista... é a perder de vista... o sol lá no alto... ao longe no horizonte...
e segredo aqui...
custa tudo mais... sobretudo por ser assim repentino...
sem tempo para nos ajustarmos... nos consciencializarmos...
essa tomada de consciência... é, deverá ser importante, digo eu...
e sobretudo solitária...

na distância instala-se um vazio... mas estranhamente a companhia permanece...
porque o pensamento é mais recorrente... 
e assim nestas viagens imensas e imaginárias, aproximo-me da estante e retiro um disco dos piano magic, que introduzo na gaveta do leitor de cd... 
o som familiar que logo se inicia e tudo preenche... the nostalgist...
apenas para tentar abafar e afogar esse pensamento que permanece... e se fixa... desconfortável e duro... frio e seco...
e que alguém em algum momento apelidou de saudade...