sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016



deleite > intro | the xx


devia ser sempre assim...

melodias melosas que se prendem à pele e à memória e jamais se apagam.
os the xx são assim... sempre assim.
as vozes em diálogo... em encantamento... como se de uma dança... um baile se tratasse...
jamie XX e romy madley croft conversam... e cantam... e encantam...
essa cumplicidade existe pouco... é rara mesmo... e surpreende...
em todas as melodias os the xx... confundem... especialmente em concertos ao vivo...
surgem inesperados... e quando se aguarda algo... tudo surpreendem.
mesmo a forma de tocar... toca-nos.
esse constante bailado... as guitarras como parceiros... nessa constante dança delicada... como delicados são os acordes das suas músicas... e as vozes... surdas... roucas e sussurradas... embalam e entontecem...
são delicados... mesmo no uso das palavras... contidas...
e as melodias surgem frágeis... propositadamente débeis...
fracas e debilitadas... assim mesmo entoadas...
oiçam-se então os the xx... como devem ser ouvidos. desde o princípio... intro... para começar...




Romy Madley Croft

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016















cansado de nada > a single kiss | trembling blue stars


existe um cansaço, reconheço...
reconheço que existe um cansaço em mim... em nós...
reconheço que existe... mas não o conheço...
nunca tinha sido assim... até aqui... até agora...
existe uma distância... instalou-se um silêncio... 
que não reconheço... que nunca antes conheci em nós...
e esse frio desconfortável tudo invade... e impossibilita...
antes, afasta... e no silêncio... mudos existimos...
são assim as melodias dos trembling blue stars... sempre assim...
de rupturas... quebras, enganos e desejos...
sobretudo de memórias... das relações que falharam...
e é desse colapso que se alimentam... revivendo... tudo remexendo...
aos sobressaltos partimos de música em música... e uma quase constante...
o fim de um relacionamento... que todos abala... e sempre alimentou a alma solitária de bobby wratten... 
por vezes vive-se assim... de fracassos... de enganos... de desenganos...
e as desilusões e decepções podem ser boas... 
que o digam... peter hammill... breathless... trembling blue stars, entre tantos outros...
fico-me então nessa mágica descrença que percorre estas melodias... nessa decepção e desesperança... que as torna tão belas e frágeis...
oiço... a single kiss... como poderia ouvir uma outra qualquer... qualquer outra.


terça-feira, 23 de fevereiro de 2016



na praia > the beach | newOrder


o verão é assim... 
menos intimista... mais libertino. propício.
no inverno as pessoas escondem-se... refugiam-se... isolam-se.
existe uma maior propensão para a solidão... em dias curtos e noites maiores... e longas.
a luz parece morna... dir-se-ia filtrada... pálida mesmo.
e o frio existe e instala-se... e permanece.
as melodias são também elas mais soturnas... cinzentas e melancólicas...
apetece ouvir os discos dos durutti column em catadupa... especialmente os mais tristes...
e ficar assim quieto... como que dormente... que não adormecido...

no verão... no verão não...
a luz é demasiado forte... e o calor sufoca... e tira as pessoas de casa...
e pele quente escurece... bronzeada... e a roupa que se usa é pouca...
os dias permanecem enormes... e as noites abafam e impossibilitam de dormir...
os corpos desvendam-se... e o isolamento desaparece...
as bebidas circulam de mão em mão... e os sons são também eles mais fortes e descarados...
por vezes apetece dançar... as músicas estivais... que não outras reservadas e menos propícias...
ao longe entre a multidão que ruidosa se diverte consigo distinguir o som...
e esse só pode ser the beach dos newOrder...

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016




















em viagem > no north left | jack


existe sempre um aperto... quando viajo...
não, não é que não goste de viajar... regresso sempre entusiasmado... e a querer voltar atrás... a viajar de novo... e regressar...
simplesmente aquando de partir... sinto um desconforto... uma inibição...
não gosto... dos dias que antecedem a partida... a véspera...
não gosto de fazer  a mala... apenas no regresso tenho mais facilidade...
e... assim que chego... a sensação d alívio... é também um misto... de tudo querer repetir...
de voltar atrás... e fazer tudo de novo...
sim, eu sei... parece estúpido visto assim... dito assim.
faz-me lembrar o sons and fascination e o sister feelings call dos simple minds...
não sei... sempre associei esses registos a partidas... a viagens...
talvez pelas imagens... a fazer lembrar o embarque num qualquer aeroporto...
o movimento... o desfoque... a rapidez... imagens intrépidas mesmo... como que depressa... em suma, em viagem...
e hoje esta viagem passa também... por remembrance dos gusgus... mas sobretudo por no north left dos jack.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016





















o princípio do fim > crash | john foxx & louis gordon

um dia irás recordar-te de mim...
pelas melhores... sobretudo pelas piores razões...
ficarão sempre lembranças boas... felizes... mas acredito que o que prevalecerá será o menos positivo...
a nossa memória é assim mesmo... tende a valorizar o negativo...
prevalece o menos agradável... imagina, é simples...
uma relação poderá deitar tudo a perder por vezes numa simples conversa... num mal-entendido... que ficou por esclarecer... ou até talvez... numa única frase que fere e agride...
o fim tem sempre um princípio... já o cantaram os editors...
no princípio ninguém almeja ou deseja o fim. antes, ninguém o antevê...
no princípio é difícil... impossível imaginar o fim...
mas ele existe... ele está já presente... simplesmente porque tudo o que começa... há-de... tem de acabar.
e se no início tudo aparenta ser fácil... feliz e brilhante... existe uma alegria e um frenesim cintilante... que tudo ofusca e oculta... 
ou como diriam os this mortal coil em estranha sintonia... e alguma sabedoria... it'll end in tears...

acidente por acidente... fico a ouvir john foxx & louis gordon... crash... ou seja... 
no princípio, o fim...

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016





















serenidade de novo > cadence | robin guthrie



calma. tranquilidade... serenidade nunca antes experimentada...
ouvir um qualquer disco do robin guthrie carrega em si um sossego... uma harmonia e um equilíbrio que poucos músicos encontram... o john foxx, o peter hammill, o harold budd e o david sylvian a espaços... mas no caso do robin guthrie é uma constante... 
inicialmente com os cocteau twins... mais tarde em algumas melodias dos violet indiana... nas suas inúmeras e imensas colaborações... mas acima de tudo a solo. em nome próprio. como deve ser.
quietude... amenidade desta estranha-se. pela invulgaridade...
melancolia assim... tristeza até...
serenidade... sossego... 
sossego assim não há memória...
esta tranquilidade que se adensa e aprofunda...
chega-se até um estádio de melancolia... uma tristeza serena e majestosa...
de onde não se pretende sair... nunca...
uma bonança que não se quer ver partir... pela singularidade.
retorno assim o disco ao início... porque é pelo princípio que tudo deve começar...





nada > blue skied an' clear | slowdive


o que escrever quando já não há nada para dizer?...
o que escrever quando já não há nada a escrever?...
o que escrever...
fica-se assim... mudo... sem vontade qualquer... sem qualquer vontade de falar... de expressar... 
medo até talvez... que as palavras firam...
e agora tudo fere... o silêncio... as palavras... todas as palavras...
tornou-se impossível o diálogo... tudo ofende... porque tudo se defende...
a distância sobretudo... protege... 
e há uma música que acompanha momentos assim... e essa música só pode provir de um lado apenas... único... e essa música... seja ela qual for... invariavelmente pertencerá aos slowdive... porque os slowdive são áridos... desolados... frios e solitários... como também o são os explosions in the sky... ou mesmo os... montgolfier brothers. e sobretudo os mogwai...
mas os mogwai têm... contêm tudo. a desolação... a raiva... a solidão... o desespero... o silêncio até... que por vezes incomoda e fere...
aos mogwai pertence a frieza... o desencanto... a desilusão como mais nenhuns conseguem transparecer...
nos mogwai reside a esperança... o desalento... a degradação mesmo.
mas existe ali... reside ali uma réstia de melancolia... consternação até.
e essa será sempre a companhia ideal quando já não existe lugar à companhia...
porque apenas música assim preenche toda uma vastidão... uma imensa solidão...

 

a electrónica não é má > one | malka spigel


a música electrónica não é má... não faz mal. algum.
a tecnologia não é assustadora... não faz mal... nenhum.
a música electrónica contemporânea não carrega mais o estigma de frieza... distância e maquinal...
longe vão os belos tempos dos kraftwerk.. dos tangerine dream... do edgar froeze...do klaus schulze... antecessores e precursores... de brian eno... joh foxx... gary numan... daf e afins... até o david bowie na sua trilogia de berlim por aqui andou... ou não estivesse à época acompanhado da vanguarda...
todos os que se lhes seguiram... descendem directamente do art of noises da bauhaus...do rock alemão e dessa música compassada e maquinal cujo expoente maior reside nos kraftwerk...
e tanta descendência deixou... até que os new order acidentalmente produziram em meados dos anos 80oitenta... essa melodia chamada blue monday... que sem fazer a viragem... fez.
o power corruption and lies terá sido o precursor... o primeiro indício... ao conter your silent face... mas sobretudo leave me alone... deu origem a uma maquinaria humanizada...
a electrónica deixou de ser indiferente... maquinal e distante... passou a conter em si... alma.
música desalmada, porque sem alma... passou agora a ter sentido e sentimento...
as máquinas carregam em si... raiva... sedução... paixão... amor até talvez...
é impossível ficar assim indiferente... porque tudo se tornou diferente...
a música electrónica não é de todo má... e não faz mal nenhum...
por isso dedico os próximos minutos a ouvir one de malka spigel... e do seu transparente parceiro colin newman...





















lustres ilustres > river of flame | and also the trees

acendam-se todos os lustres e demais parafernália eléctrica...
deixem passar os ilustres and also the trees...
ilustres desconhecidos afirmaria eu...
provavelmente porque interessam... possivelmente porque são bons...
a sua música contem dentro... as balalaicas... os czars e todos os mistérios do início do século XX... o fausto das grandes festas e bailes... mas igualmente um frio gélido e uma solidão difícil de sequer imaginar...
aqui não há ternura... aqui não há doçura, nem desejo...
dissimulada uma névoa... ténue de emoção... mas uma emoção débil... e frágil como por vezes a música dos and also the trees consegue ser... próxima da delicadeza e fragilidade dos durutti column... etérea... que não eterna...
contam-se estórias de sintra até talvez... o lugar onde o imaginário destas melodias melhor assenta... de penumbra... nevoeiro e até talvez algum mistério...
contam-se estórias que percorrem a própria história... o fausto dos grandes bailes no hermitage... até à própria queda da monarquia russa... tudo aqui cabe dentro...
até por vezes bucólicos e próximos das paisagens campestres de uma grã-bretanha em meados do século XX... onde se assemelham aos eyeless in gaza... e demais parentes musicais dos idos anos 80oitenta do século passado...
acendam-se assim todos os lustres.. para se ouvir este pedaço de estória que perpassa todas as melodias dos and also the trees...

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

 

sedução e razão > head in a cave | swallow


nem todas as pessoas gostam de o ouvir dizer...
mas os swallow, que me desculpem os puristas...
são uns cocteau twins em segunda mão...
e não tem mal... mal algum... nenhum.
creio que todas as editoras em determinado momento padeceram do mesmo mal...
as réplicas das bandas mais marcantes... e com alguma exposição...
se na factory os section 25 eram o papel químico dos joy division... e até também os the wake... o foram mesmo na mutação dos new order...
na 4AD... existiram várias tentativas e perseguições...
mas os swallow foram e sempre serão... uns cocteau twins requentados...
não que fossem maus, antes pelo contrário... eram bons.
estranhamente até produziram música ao alcance de poucos... 
até talvez mesmo dos cocteau twins... peekaboo... (num piscar de olho a siouxsie & the banshees)... oceans and blue skies... cherry stars collide (aqui descaradamente cocteaus)... follow me down... e o majestoso head in a cave...
pergunta inocente... poderão os discípulos ser melhor que os mestres?...


as linhas desertas dos lush > desire lines | lush

os lush estão de regresso... aliás já têm um novo ep no mercado... blind spot de seu nome.
e até está previsto um novo álbum para este ano. confesso... não sei o que dizer...
não sei o que pensar... não tenho expectativas. algumas. nenhumas...
tenho receio. sim, tenho algum receio... que este regresso seja como tantos outros...
a falência das bandas... nas novas reencarnações...
não é que algo que receie... 
os lush nunca foram óptimos... antes... foram bons... sobretudo eficazes em algumas melodias... desire lines... when I die... light from a dead star... etheriel... never-never...last night... algures nas versões... inesperadas... como as dos wire... ou quando tiveram a seu lado o robin guthrie...
e regressam agora... reduzidos a um trio... 
a expectativa... não é imensa... não é enorme...
acredito que regressem mais serenos... e maduros...
agora não estou na esperança que repitam o que os the names conseguiram em stranger than you... 30trinta e 3três anos após swimming... 
aguarda-se o novo registo de seu nome blind spot... sendo já possível ouvir out of control... que antecederá um álbum...



segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016















outra e outra vez > a private view | bill nelson

por vezes é também assim...
regressa-se invariavelmente ao mesmo.
e inadvertidamente. por vezes é assim...
é automático... por impulso... 
por vezes é mesmo assim... anda-se sempre de volta do mesmo...
contorna-se... envolve-se e retorna-se... ao mesmo lugar. lugar comum.
com o the love that whirls (diary of a thinking heart) do bill nelson é inevitável.
é apenas uma questão de tempo... tal e qual.
como acontece com os lowlife... os breathless. até mesmo com os and also the trees...
mas sobretudo com este disco do bill nelson... o primeiro que lhe conheci...
se calhar até poderá ser por isso mesmo... ou talvez não...
com os breathless e o chasing promises... igualmente.
no caso dos lowlife tudo remete para diminuendo... também o primeiro registo que deles ouvi... e do mesmo modo para os and also the trees e virus meadow...
e se pensar melhor vem à memória... caught in flux dos eyeless in gaza... e crumbling the antiseptic beauty... dos felt
para os the durutti column... sem dúvida LC...
quase todos os primeiros registos que destas bandas ouvi... e onde com frequência regresso e retorno...
outra e outra vez...



ausência > can I explain the delay? | colin newman



como se justifica a ausência?...
o que fazer na ausência?...
em momentos assim... o tempo parece passar mais... devagar...
e tudo se dilata... e torna... enorme... desconfortável.
na ausência tudo custa a preencher... 
porque nada há para fazer...
custa sempre mais... o tempo a passar... tudo parece dilatar...
aumenta a distância... e o pensamento que se fixa...

como uma pancada na nuca...
assim só. seca e fria. inesperada mesmo...
mas que atordoa... e dói...
como explicar a ausência?... esta ausência assim prolongada...
que já não se esconde... impossível... 
e assim se divulga... e divaga.

o que justifica a ausência?...
a distância... o tempo... apenas o momento...
por vezes quanto mais longe... mais por perto... próximo mesmo. do pensamento...
constante... exactamente pela distância... pela impossibilidade imediata...
a saudade... e a memória...
por vezes vive-se até de recordação... fixa-se a lembrança...
e inadvertidamente ouve-se colin newman... can I explain the delay... 





pensão avenida parte 3 > english rain | the wake


desta vez... disse-me na entrada com um ar muito sério...
desta vez é que vou mudar de vida... é mesmo desta vez... acredite.
a rapariga ali, assim diante de mim frágil... até dava para acreditar... mas não... não seria ainda desta vez... eu sabia-o... 
e olhando-a fixamente nos olhos e segurando-lhe ambas as mãos disse-lhe... acredito.

a verdade é que todas as raparigas que frequentavam o segundo andar da pensão miranda, eram reincidentes... 
tentavam partir... voltavam sempre... invariavelmente sempre...
não havia como acreditar...
mesmo uma rapariga magra que por uns tempos deixei de ver... mesmo essa que era do norte, e que segundo constou... partira para sul, mesmo essa, regressou...
as histórias de vida aqui... são simetricamente iguais...
ausência de sentimentos... uma inerente fragilidade associada a solidão... raparigas oriundas de famílias desestruturadas... normalmente com diversos irmãos...
fazia... faz pena por vezes... aceitar essas situações e formas de vida... 
singulares formas de vida diriam alguns...
a música que ecoa no saguão e invade todas as traseiras dos edifícios essa é sem sombra de dúvida english rain dos the wake... provavelmente oriunda do mesmo transistor de plástico preto... que é companhia habitual do senhor que tem uma oficina de restauro de mobiliário na cave... e invariavelmente dispõe as cadeiras, uma vez arranjadas... ao sol do quintal...

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016



pensão avenida parte 2 > blue monday | newOrder

existe música mais tocada do que esta...
tem uma batida que creio... agradou a todos... a todos mesmo.
mesmo na entrada da pensão miranda... o jornaleiro que ali existiu... passava-a insistentemente no seu pequeno rádio de plástico preto... 
por vezes quando as pilhas estavam perto do fim... a música surgia diferente... perante a indiferença de todos os que por ali pernoitavam...
as raparigas de vestidos soltos e floridos... perante os piropos dos transeuntes que passavam... 
os quartos 16 ao 19... toda a gente sabia... estavam invariavelmente reservados... para potenciais clientes das alegres raparigas...era no primeiro andar... um piso mais sombrio e deserto... durante o dia...
à noite... ganhava vida... e transbordava de incessante movimento e barulho... que apenas acalmava já o dia nascia...
na pensão miranda a madrugada sempre foi muito agitada... pouco monótona...
o dia, sim... era tranquilo... quase não se avistava ninguém... 
o ruído permanente lá fora... o crepitar das sirenes das ambulâncias... 
apenas nas traseiras onde por essa hora batia o sol... o barulho dos pássaros... e o cheiro da roupa lavada... 
e a constante música que também por aqui perpassa... oriunda da loja do piso térreo... blue monday... newOrder... e tudo faz esquecer...


já fui muito rico > pins & wax | in camera

já fui muito rico... já fui quase milionário...
sabes... tinha o amor da tua avó... creio...
creio que deus levou-ma por ciúmes... 
já fui muito rico... nesse tempo era um verdadeiro afortunado...
vivia feliz... só mais tarde me apercebi do real valor...
quando a perdi... só então me dei conta do seu valor... e da dimensão desse amor...
agora, agora não... já ninguém gosta verdadeiramente de mim...
e mesmo que gostem... não é a mesma coisa... não tem aquele alcance... aquela dimensão...
já fui muito rico, acredita... já fui milionário...
tinha a mulher mais bonita do mundo junto a mim...
agora vivo só... dia a dia... e quando revejo as fotografias antigas... é que sei a sorte que tive... só agora o sei...
parecendo que não... a vida foi muito curta... 
quando a felicidade se instala... mesmo que por breves momentos... tudo passa muito depressa... tudo passa a correr...
ficaram-me as memórias... as recordações... 
ficaram alguns lugares... e viagens... restaram os filhos... 
as fotografias, alguns filmes que partilhámos... e a música...
como esta que agora mesmo começo a ouvir... pins & wax... in camera...








quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016





















quarto com vista > angel | the wolfgang press

não é muito vulgar...
não nos meios urbanos...
nas cidades nem todos os quartos têm vista, privilegiada...
alguns nem vista têm...
o meu actual por exemplo... dá para um saguão... um vazio que por vezes se enche de sons...
e no pino do verão... quando o sol está no seu ponto mais a norte possível... vê-se por volta das 14catorze horas... um fio de luz que desliza pela empena... e tudo torna mais atraente... e aquece e ilumina...
essa é a vista... que presentemente tenho e desfruto...
compensa quando cai chuva forte... especialmente durante a noite... 
produz um barulho fantástico... reconfortante...
ali assim deitado... enroscado nos lençóis e cobertores... sabe bem o som da tormenta lá fora... 
e por vezes é também através desse vazio que escuto as canções lá do outro lado da casa...
e de onde vêm as canções?...
provavelmente vêm da vida... 
como esta que agora reconheço na distância... angel... the wolfgang press.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016





















pensão avenida parte 1 > room | simple minds


este quarto alugado, no segundo piso... junto das águas furtadas, onde habita um velho actor de teatro...
no quarto número 24, um reformado da CP, que costuma sustentar algumas raparigas (moças como ele lhes chama), que uma vez por semana o visitam.
no número 26, uma solteirona de passado desconhecido e a rondar os 45quarenta e cinco ou mesmo 50cinquenta anos (embora ela afirme ter 37trinta e sete), de cabelo oxigenado e saias de tamanho menos próprio para uma "senhora" da sua idade, e que apenas sai de noite.
um rapaz loiro da marinha grande no quarto 29, mas que poucas vezes vem.
nas traseiras onde de tarde bate o sol, os canários em gaiolas penduradas... o odor da roupa colorida a secar... o cheiro ainda a sabão fresco no ar húmido...
a dona rosa, viúva do senhor miranda... que hoje em dia administra sozinha o estabelecimento, próspero em outras épocas de grande afluência de pessoas que chegavam da província... em busca de um emprego bem remunerado na grande cidade... e que não existe mais...
as montras das lojas agora fechadas... os vidros partidos e graffitados... onde um grupo de rapazes africanos se costuma encontrar... uma moto que passa veloz... 
um carro descapotável que ruidosamente pára... no seu interior dois rapazes... a música que ecoa nas potentes colunas... room... simple minds...

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016


é novidade > dreaming of you | cigarettes after sex


a novidade cheira a bafio... a mofo...
o que neste caso não quer dizer rigorosamente nada...
os cigarettes after sex são bons, muito bons...
a voz de greg gonzalez é dúbia... engana.
existe aqui uma transexualidade evidente... surge na memória hope sandoval e os defuntos mazzy star... elysian fields... e a voz rouca de jennifer charles... os beach house... de victoria legrand...
aqui tudo o masculino soa a feminino... e estranha-se...
as melodias surgem e seguem-se impossíveis de não gostar...
dreaming of you... nothing's gonna hurt you baby... affection... starry eyes... todas carregam em si uma visceral melancolia... um encantamento carregado de uma matriz sexual... que não assexuada. 
essa languidez... essa pretensa atmosfera sexualmente inebriante... lembram os bares nocturnos de beira da estrada... néons anunciando sonhos que ficaram por concretizar... e porque não o lado menos ingénuo dos slowdive na voz angélica e virginal de rachel goswell.
perpassa também por aqui a cosmopolita indiferença dos suicide... tal como alan vega e martin rev a descreveram...
aqui tudo cheira a transgressão... traição... num imaginário sexual onde não cabe a palavra fidelidade...
a felicidade segundo os cigarettes after sex...  é permissiva... proibida... e sedutora por isso mesmo...
a infidelidade é o mote... mas isso também já não é nenhuma novidade... 

 

dífícil de entender > mogwai fear satan | mogwai

é difícil, eu sei e entendo...
gostar de mogwai...não é para todos.
apenas alguns... 
sim, eu sei... detestar os mogwai é fácil... sobretudo de entender...
aquela raiva contida que por vezes surge e se solta... não é fácil de digerir...
por vezes destilam ácido em demasia... numa energia invulgar...
porque pouco comum... e difícil de aceitar... sobretudo entender...
quem está emocionalmente preparado para os mais de 16dezasseis minutos de pura energia de mogwai fear satan...
quem tem disponibilidade para os 8oito minutos de scotland's shame... e dessa frustração contida... desespero... raiva... e melancolia...
por vezes sofre-se... sofre-se quando se ouve mogwai... 
músicas assim tudo interrompem... e questionam... não deixando espaço para mais nada...
ouvir mogwai assim... sufoca... torna-se um suplício desejado...
são melodias como estas que demonstram que a pesada herança... torna-se um fascínio...
os fantasmas que existem aqui são higienizados... como uma ferida após sutura...
existe nesta raiva uma estranha serenidade... 
por aqui existem também os swans de michael gira e jarboe... os wire de 154... os throbbing gristle de discipline... os cabaret voltaire de red mecca... os arab strap... os mono de pure as snow... e tantos outros passíveis de nomear...
porque o pensamento lhes é comum... 
sim, eu sei... é difícil de entender.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016













inevitável revivalismo > this fear of gods | simple minds


era inevitável... algum dia lá chegaríamos...
foi hoje, foi agora...
oiço em catadupa os primeiros registos dos simple minds... e não, não vou corar.
é que sem ninguém saber, os 4quatro primeiros registos (leia-se discos) dos simple minds... não são maus. são mesmo bons.
oiça-se real to real cacophony... empires and dance... sons and fascination e o gémeo sister feelings call... e espreite-se o new gold dream...
propositadamente deixei de fora o 1primeiro... life in a day... menos intenso e carismático... ainda muito cheio de referências... e fantasmas.
o real to real é soberbo, mas deixem que lhes diga. o empires and dance é sublime... 
ambos contêm melodias difíceis de imaginar... e esquecer...
senão oiça-se premonition... changeling... film theme... do primeiro... 
e I travel... today I die again (não serão estranhas aqui as referências aos ultravox e the man who dies every day mas igualmente every day I day de gary numan e os tubeway army)... this fear of gods... capital city... thirty frames a second... room... do empires and dance...
o life in a day já deixava pistas... apontava caminhos... life in a day... pleasantly disturbed... destiny... mas ainda estava muito colado a bowie... eno... roxy... magazine e afins...
mas o que dizer do sons and fascination... soberbo? sublime?...
em suma, tudo isso e uma coerência que ainda não imperava nos antecessores...
e o risco de fazer um disco duplo... na época, tão em desuso... arriscado mesmo...
e assim nasceu o sons and fascination e a sua alma gémea de seu nome sister feelings call...
o mais estranho é que ambos os registos são coesos... intensos e muito, mesmo muito bons...
não vale a pena referir ou salientar melodias... são todas, mesmo todas igualmente boas...
e estranho mesmo é o single mais famoso ter sido extraído do 2segundo disco ao invés do 1primeiro...
era evitável dirão alguns... era inevitável, digo eu...