velhos diapositivos de uma cena nocturna > are you ready? | crispy ambulance
aspectos de uma cidade contaminada pela
luz amarela dos candeeiros, com dois carros a passar. um edifício sujo de
escritórios e um cão vadio que passa, pára e urina.
um pouco mais à frente, o mercado de
peixe, depois de se terem partido os vidros das montras das lojas sujas e distante,
o som proveniente de um bar vulgar. um néon piscando sobre a porta azul,
tentando ser convidativo. Uma rapariga que assoma e surge, menos atraente.
ao longe a alegria de crianças
brincando numa barraca de uma feira ambulante, o barulho dos carros de choque e
de um altifalante rouco.
três jovens do interior de um carro
veloz e ruidoso, provavelmente em fuga. na distância da noite uma sirene
crepitante de um carro da polícia que se apresta a pôr cobro a mais um assalto.
no largo central, no chão de pedra
molhada... o rascunho amarrotado de uma ignota carta de amor. apenas
perceptível a data, setembro de 1972.
no largo central, a igreja iluminada... no seu interior, velhas ajoelhadas na inconfortável madeira... rezando viúvas
na pequena capela. contam sobretudo mágoas, maleitas próprias de quem há muito
experimenta a solidão. No altar brilhante, flores murchas espalhadas. como
rosas.
passa estridente uma ambulância que
ziguezagueia entre os carros no trânsito, tentando percorrer as intermináveis
ruas da cidade. no seu interior um enfermeiro aflito, luta. e um paciente idoso
que tranquilo, decide partir, indiferente à azáfama citadina que o rodeia.
já não existe música aqui, já não
existe melodia. nem mesmo som algum. nenhum. confesso.
podia ficar aqui toda a noite.
podia ficar aqui toda uma noite.
a ouvir essa composição hipnotizante
que é… are you ready?… crispy ambulance… 1982.
podia ficar assim toda a noite…