quinta-feira, 31 de dezembro de 2020














2020 e o seu fim > often a bird | wim mertens


enfim. seja.
esta será certamente a última vez que escrevo em dois mil e vinte.
ano que agora... que hoje termina.  
e que estranho ano foi e ainda o é...
vamos lembrá-lo com alguma mágoa... como alguma excepção... mas sobretudo iremos recordá-lo com alguma admiração.
por tudo o que aconteceu e se tornou... mas sobretudo pela perplexiadade.
e pela reacção. inesperada. 
humana, reacção humana em cadeia... e que permitiu, imaginamos estes avanços científicos improváveis... a tão breve prazo.
essa a melhor notícia... senão mesmo a única.

agora aguardemos por 2021 e esperemos alcançar alguma normalidade... 
seja lá o que isso fôr...

segunda-feira, 28 de dezembro de 2020



exactamente > to obey | wim mertens


faz assim.
sim, faz isso.
faz exactamente como eu te digo...
faz exactamente como eu faço...
faz. faz exactamente.
faz.




o outro lado > a sandy shore | wim mertens


o outro lado de tudo.
nada.
tudo começa com pouco. ou mesmo nada.
nada apenas.

sim eu sei.a música de orquestra é uma coisa complexa... escrever música assim é deveras complexo.
mas o tempo o dirá... o tempo tudo dita...
e aproxima... destes mesmos lugares e sons...
e o que resta é isso mesmo. apenas isso.
apenas esse pouco... quase nada... e no entanto muito.

fico. permaneço aqui. assim. 
apenas. e oiço... a sandy shore... wim mertens.

domingo, 27 de dezembro de 2020










inquérito indirecto (parte dois) > hania rani


envelhecemos. sem dúvida.
dia a dia, envelhecemos. sem consciência.

envelhecemos com o decorrer do tempo...
ou seja, todos os dias... sem sobressaltos diários...
nota-se evidente com o correr dos anos... não dos dias.
fisica, mas sobretudo mentalmente.

deixei de ter disponibilidade para tantas aventuras... tantos disparates e futilidades que já tão feliz me fizeram... e o quanto me diverti e feliz eu fui, apenas eu o sei.
deixei de ter tempo para aberrações e improbabilidades...
o tempo corre agora demasiado depressa para o poder desperdiçar...
o tempo corre sobretudo... contra mim...
bem vistas as coisas, sempre correu... apenas não tinha essa consciência... da sua passagem rápida e efémera...
agora tudo tem outro valor... outro significado.
wim mertens ainda existe em mim... esse mesmo wim mertens desses verões carismáticos e descontraídos... descontrolados até... em que em conjunto fomos eternamente felizes... mesmo sem o saber.
esse mesmo wim mertens que agora mesmo oiço... e que carrega em si toda a nostalgia do tempo... que invariável passa... e me deixa menos tempo.
o tempo não me permite mais tempo... antes pelo contrário... segundo a segundo, simplesmente esgota o meu tempo... e aproxima-me da sua ausência.

no entanto muita dessa mesma música acabou... extinguiu-se no seu tempo... agora inevitavelmente sem sentido, que não a melancolia e a memória...
wim mertens como alguns outros... sobreviveu. 
a sua música resistiu... ao tempo, ao seu tempo e tornou-se imtemporal.
e assim igualmente surgiram outros sons... outras músicas a que até aqui não tinha prestado a devida atenção. 
provavelmente pela sobriedade... pela sua sinceridade.
demasiado diversas para uma juventude que se queria... rebelde e diferente.
mas esta mesma melancolia é diferente... porque boa... profunda e duradoura...
que faz do tempo que urge... a sua importância... porque não se esgota a cada instante e momento...
e sobrevive. 
seja na voz do robin guthrie... do harold budd... do wim mertens... do philip glass... do john foxx... do riri shimada... dos cemeteries... ou tão simplesmente afagada por hania rani...
simplesmente porque tudo o que ela faz e constrói... é majestoso e magnânimo. 
e sim, é natal...

inquérito indirecto















inquérito indirecto > glass | hania rani

por vezes há discos assim, música assim.
de que preciso... que me fazem falta.
como este agora, que escuto agora.
os discos do harold budd são quase todos 
assim... indispensáveis... comprometidos. comigo.
e isso representa a falta que me fazem.
o quanto deles necessito.
não é uma dependência... antes uma necessidade. uma essência.
da qual não é preciso fugir.
antes... para onde é imperioso ir.
torna-se assim essencial e indispensável estar... permanecer. 

o mesmo se aplica a toda a constelação musical criada por hania rani... essa pianista e compositora de melodias infindáveis... que tal como robin guthrie e harold budd... ou kyle j. reigle... constroem melodias de uma dimensão inatingível... 
e que invariavelmente se tornam imtemporais e inesgotáveis...
 e às quais se torna imprescindível retornar sempre...



quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

uma questão de volume > virgin prunes













uma questão de volume > virgin prunes


por vezes é apenas uma mera questão de volume.
e que tanto significa. tudo significa.
seja na música dita erudita ou clássica... seja na mais pura electrónica ou mesmo rock...
o volume conta. e conta muito.
por vezes conta tudo.
não me imagino a ouvir um qualquer registo dos kraftwerk no volume 1um ou 2dois do meu amplificador...
muito menos dos clan of xymox... lowlife... ou sobretudo dos virgin prunes
não faz sentido algum. nenhum.
o volume serve para isso mesmo... para se ouvir e ser ouvido. melhor. mais alto.
o volume serve para libertar... e tudo tornar mais visível e audível... e rebelde.
faz parte de uma determinada idade... 
e forma de estar e entender... que provavelmente estamos aqui.
digam-me quem iria escutar uma qualquer orquestra sinfónica no volume 1um ou 2dois... de um concerto presencial... em que certamente toda a magnificência e amplitude se diluiriam... e essa mesma majestosidade simplesmente não se faria ouvir... exactamente por tudo por vezes se resumir a ser uma questão de volume.


chuva > the banality of evil | nine horses


chove, chove lá fora.
chove constantemente lá fora... uma chuva miúda... que se tem mantido ao longo de toda a noite... durante todo o dia.
gosto. confesso.
gosto destes dias, assim... em casa.
por vezes vou à janela e fico a observar... a chuva a cair incessante... e metódica.

gosto da chuva... gosto sobretudo de ouvir a chuva lá fora... agreste e forte... na copa das árvores... nos vidros da janela.
mas gosto ainda mais, noite dentro... aquelas noites intempestivas e descontroladas... e eu assim só. deitado e alerta... tentando perscrutar todos os seus sinais e ruídos. minuciosamente... e meticulosamente.
e aqui... recolhido, simplesmente observo.
o mau tempo lá fora... através do dia cinzento, escuro e molhado... e do vento... e da música que lenta discorre e vagueia... the banality of evil... nine horses.

terça-feira, 22 de dezembro de 2020




a trilogia encantatória > the wolfgang press


sejamos exactos, sejamos correctos.
o scarecrow foi o primeiro a sair... ainda em 1984...
concretamente em agosto de 84... e o número de catálogo bad 409.
seguiu-se-lhe o water, em março de 1985... número de catálogo... bad 502...
o sweatbox remonta a julho de 1985... bad 506.
existem todos em versão de 12 polegadas apenas com uma única edição inglesa.
talvez por isso tenham sido posteriormente compilados em novembro desse mesmo ano de 85 num álbum cujo número de catálogo é cad 514... e que dada a dimensão dos máxis... mas sobretudo a limitação do vinil... deixava para trás dois temas... concretamente the deep briny constante de water... e muted de sweatbox.
chamava-se the legendary wolfgang press and other tall stories... e era graficamente igualmente concebido por alberto ricci... pintor amigo de michael allen dos tempos da escola de arte... e que concebeu as 4 capas destes magníficos discos...

esta trilogia... estranhamente pouco visitada ou sequer conhecida pela maioria... é no entanto uma obra notável de coesão... dado que foi construída em pouco tempo... e cujo álbum não deixa transparecer qualquer falta de coerência e consistência.

costumo revisitá-la com frequência, assim como todos os restantes registos dos the wolfgang press... e apenas estranho o silêncio a que michael allen... mark cox... andrew gray e afins sempre foram devotados...
adiante...














 ouvir > betweenspace | blaine reininger

propositadamente. a imagem.
esta imagem aqui. 
quando o propósito é a audição... simplesmente escutar... ouvir.
quando se ouve e escuta uma pessoa... e se tentam absorver e tirar ilações... 
por vezes demasiado distantes ou mesmo erradas. da realidade.

não é o valor intrínseco da imagem... do que se vê, antecipa ou imagina.
não. é o escutar. 
simplesmente ouvir atentamente alguém.
para se tentar perceber e descortinar. 
alcançar... entender.
chegar a uma fusão... de pensamento... e concordância.
tal e qual como quando se ouve música.
o simples acto de ouvir música.
perscrutar. ouvir atentamente. minuciosamente.

ou dito de um outro mesmo modo... ouvir.
prestar atenção... e sentir.
como neste caso concreto. e actual...
betweenspace... blaine reininger...













escrever > forever never | robin guthrie

por vezes é assim.
muitas vezes é assim. não preciso dos outros para nada.
sou... sinto-me auto-suficiente.
e isso basta. basta-me.

nem sempre é fácil escrever... ou torna-se fácil. parece apenas.
não, por vezes é difícil... tudo parece e se torna demasiado difícil.
nada é fácil... efectivamente.
se tudo fosse fácil e tangível... qual o seu verdadeiro valor, questiono...

o acessível é assim, como que efémero... porque atingível...
o inatingível é o propósito... para alguns. 
para mim, neste momento basta-me esta melodia que agora mesmo oiço e cujo discorre da aparelhagem que liguei... e que contem demasiadas pérolas para serem esquecidas...
assim sendo...  fortune... robin guthrie...


 

quarta-feira, 16 de dezembro de 2020









how to make love (volume I) | jacques


nunca sei. a sério, nunca sei, hesito sempre.
nunca sei qual ouvir primeiro... de qual gosto mais...
se dos jack... ou dos jacques... ou simplesmente do anthony reynolds e de todos e de tudo.

verdade seja dita, conheci os jacques através dos jack. logo através do anthony reynolds.
o pioneer soundtracks teve um grande impacto em mim...
sobretudo pela estranheza... das suas composições...
e assim sendo assimilei os singles... onde igualmente pululavam uma mão cheia de melodias estranhas... 
e isso estranha-se... e agrada... e entranha-se.

os jacques vieram em sequência... logo no ano seguinte... em 1997, logo a seguir ao pioneer soundtracks... 
how to make love (volume I) também não é um disco fácil... talvez...
talvez mais acessível, sobretudo mais electrónico...
mas igualmente cativante e hipnotizante...
mais doce e clean...
talvez mais próximo de tudo o que o anthony reynolds sempre pretendeu e ambicionou... que foi estar ali, perto... próximo, mesmo muito perto dos seus japan de que tanto sabe e fala... e sobretudo escreve. e bem.
ainda bem.


terça-feira, 15 de dezembro de 2020


um dia >  din glorious | virgin prunes

não sei de quem partiu a ideia, acho que foi dos dois... já não recordo...
mas sei que jantámos naquele restaurante barulhento à beira da estrada...
não falámos muito, falámos estritamente o essencial... estávamos com pressa... de chegar ao destino.
a viagem ainda estava a meio... e o dia esse, chegava ao fim.

ao regressar ao carro pensei... que contamos os dias e nem nunca sabemos quantos dias faltam...
como podemos levianamente deixar passar o tempo assim só, por nós?...
todos os dias que entretanto se passam... e nos passam... e por nós passam,  é menos um dia que nos falta... e não sei se não nos fará falta...
todos os dias... um dia a mais... 
um dia a menos.



quarta-feira, 9 de dezembro de 2020


harold budd > todas as músicas


hoje morreu o harold budd
hoje ou ontem. 
já não sei bem.
eu soube hoje, soube-o à pouco.
mas num obituário diz que foi no dia de ontem. dia 7. não 8, o dia de hoje.
pouco importa. o dia.
importa a morte.
importa e releva sobretudo a pessoa, o músico...
importa a música, mas essa ficará... permanecerá sempre por aí...
acessível a quem algum dia a quiser escutar. 
como sempre. para sempre.
faltará o harold budd...  o músico e a pessoa... e que falta fará...

sexta-feira, 4 de dezembro de 2020






o supervisor > small metal gods | david sylvian


um quiosque... 
e não um... mas diversos mapas pendurados, amarelecidos pelo passar do tempo.
um jornal matutino... e na solidão do interior do espaço... uma velha vendedora, reza...alheia ao bulício da rua.
cá fora... duas raparigas brasileiras que comentam os preços... mas sobretudo os descontos... na montra de uma loja...
um par de botas brilhantes e castanhas... 
as pernas magras através das meias pretas...
a tarde que começa a findar... nestes dias que já deixam adivinhar o começo do inverno.
no alfarrabista que fica situado no beco... gravuras esbatidas... e a surpresa de um livro, uma barragem contra o pacífico da marguerite duras... em muito bom estado de conservação...
e ali de pé, simplesmente a observar as lombadas de todos aqueles livros antigos... simplesmente questiono-me...
porque não poderão as coisas e as pessoas brilhar e durar para sempre?...

parte extra...
desta extra parte...


segunda-feira, 30 de novembro de 2020



lembrança > au-delà du fleuve | wim mertens


segundo o dicionário de língua portuguesa, lembrança pode significar... recordação... apontamento, enquanto auxiliar da memória... alvitre, ideia... um presente, geralmente de pouco valor... um objecto comprado para relembrar alguém ou algo, um lugar... 
mas acima de tudo e o que mais aqui me interessa... um acto mental pelo qual a memória reproduz um facto passado.

e este disco... sobretudo esta música... au-delà du fleuve que integra a trilogia integer valor do wim mertens... traz, devolve tudo à recordação... 
e por vezes dói... custa... a memória simplesmente atraiçoa, porque custa. dói. chega a doer mesmo...
sobretudo porque os factos passados já foram vividos e regressam nunca... vivem assim apenas em nós, nesta forma crua e dura... residual... que por vezes aflora o pensamento... como uma mudança de maré... 
amamos pessoas que já morreram. qual a utilidade disso? será simplesmente nostalgia... sofrimento?... 
qual o sentido maior que ainda não conseguimos entender... e atingir...

assim sendo preciso de escrever tudo. mesmo tudo. o que recordo.
antes que se esfume e desvaneça...
preciso de entender tudo, mesmo tudo...
antes que tudo acabe,antes que tudo esqueça... e a memória se gaste. 
e finde. e se perca.
assim sendo tentarei tudo recordar... tudo visualizar... enquanto este disco avança... e me devolve à memória... a vida que entretanto já passou e gastou... e as pessoas... e os lugares... e os actos e os factos...

e foi precisamente isso que este disco hoje me fez... 
devolveu-me à memória... tempos e momentos que também eu saboreei e vivi... 
e como alguém me questionou... 
esta não era a música que a tua mãe tanto gostava?...

domingo, 29 de novembro de 2020




legado > the good son | david sylvian


devia haver um legado? 
deveria haver lugar a um legado? uma herança?...
esqueçam isso, esqueçam tudo isso...
nunca algum filho meu... em ocasião alguma demonstrou sequer curiosidade alguma...
não. nunca. nenhum.
jamais. 
nunca nenhum, sequer me abordou... e questionou...
nunca nenhum sequer equacionou... teve essa curiosidade.
demonstrou interesse algum. nenhum.
e tanta música e tanto disco decorreu... e nada.
absolutamente nada.

herança?... qual herança?
desde cedo... desde sempre que os habituei a ouvir todos os discos que invariavelmente eu consumia... e diariamente ouvia...
e no entanto nunca houve uma necessidade voraz ou simplesmente surda que os fizesse um qualquer dia vir ter comigo e sequer tivessem tido a curiosidade de perguntar...
o que é isto que está a tocar? 
o que é que estás a ouvir?
nunca por nunca ser...

verdade seja dita... sempre ouvi a minha música de eleição...
sem nunca ter tentado impingir nada a ninguém.
nunca, por não ser.

e assim sendo, vou ouvir o blemish do david sylvian... em modo solitário... 
como sempre fiz e ouvi tantas e todas as outras músicas que igualmente preencheram e foram e fizeram a minha companhia...



29 de novembro > sleep no more | the comsat angels



por vezes.
por vezes apetece-me telefonar-te. é, creio, um impulso.
penso... vou telefonar-lhe... assim só, vindo do meu pensamento... vindo do nada...
mas hoje é indiferente... é sobretudo diferente.
faz anos que me deixaste,um sábado pela manhã por sinal.
foi uma chamada estranha, porque muito cedo, especialmente para um sábado de manhã.
e as notícias não eram obviamente boas.
havias partido nessa noite... nessa madrugada?...
nunca me foi referido... apenas sei que pela manhã, as notícias eram de que havias morrido.
e mais pormenores... não soube. nunca os soube.
sei apenas que me deixaste... nos deixaste...
não é que fosse surpresa... não foi inesperado. 
estávamos à espera... desde há algum tempo... sabíamos que a doença te haveria de derrotar...
apenas acreditávamos que seria mais tarde... sempre mais tarde.

e faz hoje anos que me morreste... e aqui me deixaste...
29 de novembro... o ano já se torna mais confuso... 
e não sei o que diga... o que te diga.
não se celebra um dia assim... não se comemora, apenas se recorda.
e aqui estou a relembrar a tua, a nossa vida em comum... 
e assim sendo... igualmente me decido por ouvir um dos discos que porventura passou por aquela casa da avenida de madrid... e que de tanto o ouvir quase se gastou... e tantos e todos porventura incomodou...
pego na rodela metálica do compact disc e carrego no botão open do leitor de cd...
deposito o disco na sua gaveta e pressiono o botão de iniciar...
a gaveta lentamente fecha-se e a música que de imediato se inicia...  the eye dance... the comsat angels...
que inevitavelmente me devolve as memórias daquela casa que nos habituámos a chamar de nossa... até um dia... 
esse dia.





quarta-feira, 25 de novembro de 2020



não havia > discipline | throbbing gristle


só havia duas pessoas normais entre aquelas. 
veio a verificar-se anos mais tarde. apenas alguns anos mais tarde.
naquela altura tudo passou despercebido... aliás...
aliás christine carol newby... mais conhecida como cosey fanni-tutti... era a mais rebelde e estranha... numa estranheza que inevitavelmente englobava e fascinava toda a gente. 
mas apenas a ela se lhe reconheciam dotes invariáveis de marginalidade.
aos outros componentes... embora tóxicos e excêntricos...  atribuia-se essa mesma excentricidade ao seu universo artístico e musical. puro engano.

desenganem-se os mesmo mais cépticos.
havia ali muito para além da música que em conjunto construíram.
e reparem, digo construíam... e não compunham.
verdadeiramente deveria mesmo dizer... a música que juntos desconstruíam.

imediatamente identifiquei-me com o heathen earth... e havia uma fotografia tocante e estranhamente vulnerável na capa do discipline... que remetia para subúrbios industriais e inóspitos... onde os throbbing gristle sempre navegaram e onde surgiam frágeis, mas ao mesmo tempo pujantes... num enquadramento austero e clássico.
ironicamente, ere esse o mesmo registo com que costumava contemplar os meus alunos, no início de cada novo ano lectivo. assim, como um primeiro teste e embate...

mas os throbbing gristle foram... são muito mais do que isso. musicalmente.
o peter christopherson igualmente fudou os psychic tv com o genesis p-orridge após a cisão dos mesmos... e a outra metade, cosey fanny-tutti e chris carter deram origem aos chris & cosey... 
mas peter christopherson iria mesmo mais longe e fundaria os coil com o seu cúmplice amante john balance... 
por sua vez... cosey fanni-tutti... estrela emergente no universo das performances pornográficas dos anos 70... continuou ligada ao mundo performativo, e com chris carter moldou diversos registos de música electrónica absorvente...
genesis p-orridge por seu turno navegou militante e militarmente nos throbbing gristle... e nos psychic tv... antes de refundar os tgristle... e de se metabolizar com a sua mulher, lady jaye... em sucessivas transformações e mutilações, intitulada breaking sex... que o levaria a uma mudança de sexo... e igualmente de percurso musical.
até que a morte consumiu antes do tempo grande parte deste universo... restando actualmente chris carter e a sua eterna companhia... na figura de cosey fanni-tutti... porventura os mais discretos de entre todos... se é que a isto se pode chamar mesmo discrição.

não havia. só havia.
 








errado > the dreamer is still asleep | coil


o que é que está errado, quando tudo está errado?
sim, digam-me... não consigo imaginar, o que estará errado... quando aparentemente tudo está errado...

eu oiço...músicas... por vezes fotografias... leio livros... interesso-me por artigos...
que simplesmente ninguém lê... 
discos que muitos evitam... imagens que ninguém pretende observar.
 eu vejo paisagens com determinado potencial... eu escuto... perscruto... onde ninguém vê ou simplesmente ouve ou sente... nada.

digam-me...
o que é que está errado... quando tudo está errado...



segunda-feira, 23 de novembro de 2020













o fantasma persegue > resíduos dos wolfgang press


o michael allen dos the wolfgang press canta em hammer the halo..

...get that curse off my land
get that curse off my land
who said doctor's orders?
baptised i have no church
get that curse off my land

now, if i had a hammer i'd nail the halo back...

confesso.
confesso que sempre gostei dos the wolfgang press. desde o início.
corrigo. mesmo desde antes do princípio.
estranho, eu sei, pode parecer estranho... mas é verdade.
conheço os wolfgang press desde os tempos dos rema-rema e dos in camera... 
conheço os wolfgang press desde os tempos dos mass. e dos in camera.

eu explico... passo a explicar.
os rema-rema tinham no seu contexto... o michael allen e o mark cox... que nasceram das cinzas dos ditos cujos... e os mass...que debandaram e se partiram em duas metades... dando origem aos renegade soundwave e aos wolfgang press.
os wolfgang press por seu turno integravam o andrew gray que derivou dos in camera...
confusos?.... não estejam...
assim sendo os wolfgang press eram não mais do que o colectivo que continha o melhor dos mass e rema-rema e dos in camera. o que à data era um luxo, apenas reconhecido por poucos... diria mesmo, muito poucos.

passo a explicar... eu explico.
nem todas as bandas possuem ou integram um michael allen. e isso é o garante... de uma enorme e imensa desconstrução das melodias tais como normalmente as reconhecemos.
creio, que apenas reconheço um músico que pode figurar junto deste personagem ímpar.
o howard devoto... com ou sem magazine... foi... é, será?... um músico... compositor e letrista igualmente genial. 
e com a saída inesperada de unremembered remembered... disco perdido se assim lhe podemos chamar... pós funky little demons... a quem está indissociavelmente ligado... encontrei tempo para uma revisitação a toda uma obra que sempre foi de grande agrado.

o fantasma persiste e persegue.


 





sexta-feira, 20 de novembro de 2020


por favor escavem, escavem > dig a hole | the wolfgang press


literalmente. o céu está a cair...
literalmente em cima de mim... e eu não sei se aguento.
o quanto aguento...

escavem um buraco... para se esconderem...
para me proteger... deste isolamento... a que nos devotaram este ano.
ciclicamente surge o fantasma... de um isolamento crescente...
e que se não assusta... isola.
não posso ir ali...
não posso estar além...
apenas posso estar aqui.
devo estar aqui. e permanecer.

assim sendo nesta solidão a que me habituo... escuto dig a hole dos the wolfgang press...
que simplesmente referem... 
...someone grows on my fears so what?...
...some people just get on my nerves...  so what?...

escondam-se... fujam... e evitem...
prevejo que vem aí o fim de um ciclo...
que para mim pode ser finalmente... o derradeiro.




> fotografia de david sylvian258 (agradecimento expresso)




quinta-feira, 19 de novembro de 2020










parte > next | gavin friday

parte. 
em que parte...
já não faço parte. tenho consciência.
o que não deixa de ser estranho. simplesmente deixar de fazer conta.
posto assim de lado. cuja opinião já não ter sido em conta. valer nada.

não deixa de ser estranho. demasiado estranho.
a experiência e a vivência... serem assim postas de lado.
não contarem. para nada.
valerem já nada. 
não serem levadas em conta. 
e mais estranho, simplesmente porque a experiência é incomensurável.
o simples acto ou facto desperta logo um pensamento, uma imagem... uma simples solução.

mas a regra na sociedade actual...
é que o valor, o conhecimento... e sobretudo o reconhecimento, residem numa faixa etária muito restrita e fechada.
ou se é demasiado novo para poder opinar e decidir... e não seremos levados em conta...
ou demasiado velho para igualmente ser ponderado e levado em linha de conta.
a idade, associada à experiência... cultura e vivência habitam nas pessoas e qualificam.
mas a regra é a ausência... a transparência e o isolamento. 
simples e surdo. 
e já agora, mudo.

parte.
parte do que parte, já não faz parte...

segunda-feira, 16 de novembro de 2020



por 1 ou 2 segundos > it's all ahead of you | gavin friday


vi-te... não me viste...
melhor assim.
não esperava encontrar-te... cruzar-me assim naquela esquina, daquela rua... sobretudo aquela hora...
pareceste-me irreconhecível, confesso. 
um pouco desleixada... gasta na urgência deste tempo que nos impede de sarar... e descomprimir...
vestias uma camisola cinzenta escura... e umas calças igualmente escuras... o cabelo acidentalmente apanhado... num demasiado pequeno gancho preto...
parecias apressada... embora hesitante... tudo ali a acontecer na minha frente...

vi-te... não me viste...
não nos cruzámos, diria... por uma questão de um ou dois segundos...
antes assim...



um... dois > commissions | blaine reininger


que me perdoem os mais distraídos. mas tinha de vir aqui... até aqui.
simplesmente para falar dos últimos registos do blaine reininger
apenas isso.
as colectâneas commissions. commissions I e II. respectivamente de 2014 e 2019.
reunem sobretudo registos de produção para dança... teatro... quase integralmente registados na grécia e para peças de teatro e dança igualmente gregas... onde blaine reininger reside desde há vários anos.

são registos magníficos e magnéticos... que nos prendem a sucessivas audições... e que a cada nova passagem... se renovam e tendem a continuar a surpreender.
de uma maturidade e serenidade que vem desde os registos dos tuxedomoon... estas "comissões" são acima de tudo, serenas... sérias e maduras.

tento... e não consigo... são demasiado boas e viciantes estas comissões...
para simplesmente as poder ignorar ou abandonar...
e assim sendo, oiço em frenético loop estas melodias de bailado... teatro e dança... que simplesmente tudo preenchem e tocam.
e me bastam.


domingo, 15 de novembro de 2020



círculo perfeito > my mother told me | the wolfgang press

um círculo perfeito.
lembro-me da porta de ferro verde. verde escuro.
e do desenho que integrava círculos perfeitos... diria eu.
sobretudo para a idade que então tinha

lembro-me perfeitamente da porta de ferro verde escuro... encimada por seis círculos verdes de ferro... que protegiam os vidros interiores...
e da entrada desafogada e inteiramente de pedra. e ao cimo do primeiro lance de escadas, o átrio grande e luminoso.
recordo sobretudo a luz que fluía através da clarabóia situada lá no alto do terceiro andar... que coava todos os pisos e paredes adjacentes... com um lambrim tipo marmorite... mosaico hidráulico de pequenas pedras pretas...  encimadas por um friso de pedra mármore polida, igualmente preta...

e lá no alto... a clarabóia de vidros martelados, que com o tempo foi escurecendo... e deixando passar cada vez menos luz.
tudo recordo ainda... sobretudo a porta que todos e tantos dias manuseei... e que me devolvia a casa...

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

















hesito e evito > nick cave versus the wolfgang press

por vezes gosto de hesitar...
por vezes gosto assim. mesmo.
estou parado com o ghosteen do nick cave... e o umremembered remembered dos the wolfgang press em ambas as mãos... e simplesmente hesito... sobre qual disco escolher para ouvir primeiro.
uma dúvida eu nã tenho. são ambos bons.
obviamente que o ghosteen é melhor. disso também não tenho dúvidas. alguma. nenhuma.
o registo dos the wolfgang press é um disco perdido... recuperado... inexistente.
passo a explicar.
após terem gravado o funky little demons... mark cox abandonou a banda... e restaram assim o andrew gray e o michael allen... que registaram caseiramente 7 novas faixas... que é fácil identificar como sendo próximas dos registos de funky little demons...
mas que nunca viram a luz do dia... simplesmente porque michael allen partiu em perseguição de novas aventuras... 
até agora. surgem 6 dos 7 temas num mini-lp de alguma raça... mas distante do tempo que entretanto por eles passou.

o registo de nick cave... é maduro... denso e duro menos... 
surge na sequência da morte acidental do seu filho arthur... e isso marcou a sua discografia desde aí.
se já não era totalmente fácil e acessível antes... imagine-se agora.
é um disco possuído por uma dor imensa... talvez uma saudade enorme... mas sobretudo uma reflexão sobre a existência... e a sua absurda e absoluta interrupção.

assim sendo hesito... gosto de hesitar...
por vezes gosto de hesitar... mas logo de seguida opto... e pouso o cd na gaveta do leitor de compact disc... e o som que se solta e inicia... you say you love me... the wolfgang press...
















 
sexta-feira 13 > stumble and fall | clan of xymox

sexta-feira 13... mau presságio?... ou será que me pode trazer algo de bom...
não sei... nunca fui muito supersticioso, a esse ponto, digamos...
existe sempre em nós alguma reserva... o receio de um desconhecido que não antevemos... ou simplesmente não controlamos...
dia treze de novembro de 2020... ano que se antevia magnífico... e vê-se...
ninguém previu... ninguém anteviu... o que tantos e tantos relataram ficcionalmente...
existem imensos filmes e mesmo documentários que previam e antecipavam um cenário destes... e na realidade...
a realidade é muito fria... e crua...
a humanidade não está ainda... será que alguma vez estará?...
a humanidade não está preparada para ebolições desta dimensão...
o ser humano é demasiado pequeno e invariavelmente embrenhado em coisas mesquinhas... para simplesmente perceber.
é formidável a responder... a tentar, a tentar encontrar soluções... 
mas a antever...
seremos já demasiado tecnológicos... para ignorar assim a natureza que nos concebeu resilientes mas sobretudo sobreviventes...
é que ao contrário de todas as outras espécies vivas... creio, estamos já distantes de um espírito de sobrevivência e extinção da espécie... que não nos possibilita prever...

sexta-feira 13... 
será que perante um quadro onde este ano de 2020 se inscreve... ainda haverá tempo para mais e maiores complicações...


quinta-feira, 12 de novembro de 2020




saudade > prayer | the durutti column



se aqui vieres, já cá não nos encontras.
mudámos de casa... de residência.
é próxima... é perto da última morada que nos conheceste.
a casa é maior... muito maior mesmo. tem melhores condições... para todos.
apenas não temos aquele pequeno espaço exterior... aquele quintal imensamente povoado por aquela nespereira... e os melros... creio que já não te recordas...
nem mesmo dessa casa... onde foste poucas vezes... já estavas doente... e evitávamos deslocações tuas com tanta frequência...
lembro-me sobretudo de um almoço... logo no início... improvisámos uma mesa... e uma sala de jantar... e ali todos comemos...
segredo-te... nunca esse espaço foi a nossa sala de jantar... apenas naquele dia.
e igualmente recordo... o sol... o brilho e o calor... sobretudo a cor quente que a madeira do pavimento reflectia... nessa tarde, improvisadamente sentados a essa mesa, e ali se fez a nossa última refeição em família...

se nos procurares nessa casa... já lá não nos encontras...
mudámos... como sempre se muda na vida...